segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

... CASCA-LHES S. DOMINGOS!... CASCA-LHES...

A linda aldeia de Oliveira do Arda no sopé da "serra" de S. Domingos tinha um posicionamento natural, em forma de V, adaptando-se quase na perfeição ao formato que o Douro e o Arda desenharam, ao rasgar aqueles dois vales que iriam servir de leito para as suas águas de milhões de anos, e, que, se repararmos, em muito se assemelha à postura física da sua vizinha e linda aldeia de Rio Mau, no sopé da Boneca, mas com a diferença desta se encontrar na margem oposta do grande Rio Douro... que desliza lá bem no fundo, muito encostado por todo o Verão às terras paivenses e deixando bem a descoberto aquele imenso areio d' Hortos ao longo de toda a margem direita, por muitos considerado o maior areal do Douro e que os Oliveirenses tinham o previlégio de observar na sua real dimensão, e, assistir, se assim o entendessem, aos vários processos de trabalho que ali se desenrolavam, de segunda a sábado, a começar pela retirada continuada de areias e godos, através de camions que desde manhã até até ao final do dia, efectuavam num vai-vem constante pela marginal até Sebolido, para aí "cortar," até atingir o grande Areal, para depois abastecer parte de todo aquele frenesim imobiliário, em que se tornara todo o litoral nortenho, a partir das décadas de Cinquenta e Sessenta; por vezes, e, em simultâneo, dependendo da época do ano, decorriam as tarefas piscatórias, em especial do sável e da lampreia, que em nada colidiam com as extracções das areias, embora não nos custe a admitir, que os pescadores olhassem aquela outra tarefa como uma "intromissão," que em outros tempos nunca acontecera, e, porque, também não lhes agradaria nem um pouco, ver todas aquelas irregularidades e os grandes buracos, que aquele tipo de exploração ia deixando ao longo daquele grande e belo areal, que, quase formava uma meia lua nos meses do ano em que o Estio primava por secas prolongadas; também era verdade que a "violência" das primeiras cheias lá para as proximidades do Inverno, iria repôr a ordem em todo o areal, corrigindo, este e outros erros, que os humanos sempre foram peritos em cometer.
Desconhecemos se existia alguma actividade piscatória no Douro e mesmo no Arda por parte de alguns Oliveirenses, mas acreditamos que isso terá acontecido, uma vez que os vizinhos de Pedorido, Rio Mau, Cancelos e outros, tiravam partido sazonal e das mais variadas formas na captura das muitas espécies em que o Douro era fértil, valorizadas ainda porque se tratava de peixes de água doce, uma vez que as marés mais atrevidas do Atlântico, só se "atreviam" no máximo até Melres, sendo esta a razão única, porque o sável tinha um valor de qualidade e comercial superior, caso fosse capturado nos areios a montante, estamos a falar do areal de Pedorido, d'Hortos e outros...

Acontece, que todos os anos em Oliveira do Arda nos meses de Agosto e Setembro as festas em honra de S. Domingos e da S.ra das Amoras, atraíam milhares e milhares de pessoas, autênticas romarias vindas dos mais variados povoados em redor, mas também de terras distantes, dos concelhos da Feira e Gaia e até de Penafiel e Gondomar!... Este mar de gente, deslocava-se sobretudo a pé, utilizando ainda autocarros, automóveis e bicicletas, muitas bicicletas, num frenesim pouco comum nas gentes portuguesas, que parecia ter esperado sem paciência todo o tempo que medeia aquelas datas, em especial quando se festejava a S.ra das Amoras, que era encarada como uma romaria, enquanto que pelo S. Domingos estava ainda em causa um rol imenso de promessas e que as pessoas de corpo inteiro, ali bem no alto, procuravam satisfazer, procurando a ajuda, se fosse caso disso, de familiares ou amigos, quando se tratava de promessas que exigissem grande esforço físico e porque o calor apertava naquele tórrido mês de Agosto!...
Para que tenhamos uma ideia da repercussão destas festas, era comum ver alguns dos melhores ciclistas portugueses, como eram os casos de Sousa Cardoso e Mário Silva, a trepar nas suas bicicletas por aquela íngreme subida de S. Domingos e completamente dissolvidos naquela desordenada onda humana, que estava prestes a superar a parte mais curta e mais difícil duma jornada, que, em muitos casos, já durava há várias horas... Claro, que aqueles ciclistas vinham numa outra missão, já que a Volta a Portugal estava por dias, e, é de crer, que estariam a dar os retoques finais numa forma já muito apurada e que se notava pela facilidade com que "engoliam" tão duras subidas... Estes dois ciclistas, faziam parte do grupo dos melhores roladores e trepadores nacionais daqueles saudosos tempos!

Entretanto, as várias travessias no Douro, utilizando o amigo e inseparável VALBOEIRO, não tinham "parança", para com a maior ligeireza possível, trazer da margem direita toda aquela gente, que, não se conformava só em ouvir o chamamento dos foguetes e os acordes de bandas e alti-falantes dos grandes arraiais, que não deixavam sossegar os espíritos de quem é jovem ou ainda tem esse espírito, e, que, os vales, servindo-se dos ventos, se prontificavam em conduzir todos aqueles efeitos festivos pelas encostas mais vizinhas, atingindo não só estradas, caminhos e carreiros, mas também os montes, hortas e todo o casario por mais simples e desordenado, onde em última instância iria penetrar a mensagem e o convite generalizado, sem distinções; de resto estas datas eram sobejamente conhecidas, diríamos que de cor, pelos povos das redondezas e mesmo de gentes afastadas, por se tratar de romarias e tradições que vêm de muitas centenas de anos e que passam de geração em geração...
Cada povo usa a crença e a diversão à sua maneira e cremos que foi sempre assim desde a Pré-História até aos nossos dias!...
Recordo-me que em Pedorido, todos os anos pela S.ra das Amoras, um número razoável de Pedoridenses, colocava-se na N 222, mesmo junto do cemitério e de costas para o rio Douro, para assistir sorridente e divertido ao "triste" espectáculo, que lhes era "oferecido", gratuitamente, por muitos populares montando pasteleiras, vindos das bandas da Feira e, que, regra geral, não conseguiam passar com sucesso aqueles dois carris, por onde, diariamente, circulavam os vagons da Carbonífera, originando quedas de enorme aparato e sem consequências, pelo menos na ocasião, uma vez que voltavam a montar rumo a Oliveira do Arda e sem um queixume sequer... O objectivo estava quase a ser alcançado e não ia ser uma queda que iria impedir a concretização de um sonho que durava há um ano e em alguns casos há vários...

Voltando ao S. Domingos e à festa bem lá no alto, é de assinalar que serão várias as razões, porque ficamos com recordações que se perpetuaram no tempo e que teimosamente persistem no nosso consciente, porque festas haverá com certeza muitas, mas aquela tinha um lugar de distinção, porque, ali, éramos como que convidados a reflectir muito seriamente sobre quem somos e qual o nosso papel neste nosso planeta, talvez, porque não estejamos muito habituados a viver regularmente nas altitudes e isso nos deixe pouco à vontade, e, essa ocasião sublime, leva-nos a que questionemos certas atitudes, por um lado, enquanto que por outro, ficamos sem palavras, ao descobrir a grandeza do horizonte por onde quer que apontemos o nosso olhar e isso assusta, porque nos transmite pequenez e insegurança...

Antes de terminar quero aqui contar-vos uma história passada numa dessas festas a S. Domingos, ainda na década de cinquenta:
- A meio da tarde desse domingo festivo, o padre convidado dava início ao sermão em honra do Santo, respeitando assim o horário, independentemente dos poucos assistentes, algumas dezenas, muito embora se tratasse duma pequena capela, mesmo assim notava-se que a afluência dos fiéis era escassa; naturalmente, que no exterior uma enorme multidão divertia-se à sua maneira, salvaguardando os muitos casos de devotos que se sucediam nas voltas à referida capela, cumprindo assim uma parte da promessa ao S. Domingos, porque, regra geral, a outra parte da promessa, dizia respeito a uma pequena quantia em dinheiro a que ninguém tinha acesso, depositada em local apropriado; num curto espaço de tempo, dá-se uma reviravolta no estado do mesmo e a bela tarde por todos saboreada, vê-se transformada num abrir e fechar de olhos, com o desaparecimento do sol, o surgir de nuvens negras acompanhadas de trovoada e a consequente chuva torrencial, que, iria apanhar todo o arraial desprevenido... Ninguém estava à espera, ninguém estava preparado e só havia ali no ponto mais alto da serra um bom refúgio para acudir a tão grande emergência: A CAPELA DE S. DOMINGOS... Todo o arraial pensou o mesmo e a minúscula capela de repente terá registado a maior enchente de que havia memória, mas só uma pequena parte dos romeiros pôde abrigar-se, ocupando tudo quanto era espaço, enquanto o nosso abade percebendo o motivo da forte afluência dos "fiéis," deixa de lado, por alguns momentos, o rumo do seu elaborado sermão, para duma forma contundente mostrar toda a sua solidariedade com a intempérie, ao mesmo tempo que gesticulava e gritava a frase que encontrou como a mais adequada à situação, na esperança, pensamos nós, de vir a ser atendido pelo Santo em mais um dos seus milagres:

«CASCA-LHES S. DOMINGOS!... CASCA-LHES S. DOMINGOS!...»

Aquele abade não resistiu à tentação humana, diríamos quase primária, de mostrar o seu desagrado por método pouco ortodoxo, fruto da grande influência das histórias bíblicas, em especial do velho testamento, muitas delas carregadas por um simbolismo castigador e decisório e, que, continuam, mesmo no nosso tempo, a causar inflamados debates, e, sobretudo, a originar múltiplas interpretações!

Como diria alguém:- É A VIDA!...

UM GRANDE ABRAÇO PARA A LINDA E BELA OLIVEIRA DO ARDA!

RECORDAR É VIVER DUAS VEZES!

segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

... Os Rios, o Futebol e outras "rasteirices" humanas...( 2ª Parte )

Naquela tarde domingueira, aquele jogo de futebol amigável em Pedorido, foi o resultado de um ambiente eufórico e de muita satisfação, vivido na vizinha aldeia de Oliveira do Arda, que contagiou não só toda aquela juventude, mas o resto da aldeia, que não sendo tão jovem, aderiram, porque perceberam que numa época tão difícil como aquela, receber "de mão beijada" um equipamento completo, era de se lhe "tirar o chapéu"!... A desinteressada oferta, fora cometida por um emigrante OLIVEIRENSE, que daquela forma, quis fazer uma agradável surpresa, sabendo de antemão do jeito que a oferta iria proporcionar aos jovens da sua aldeia!
O Verão ia sensivelmente a meio daquele saudoso ano de 1958!
Acontece, que na época existia um óptimo relacionamento entre a juventude das duas aldeias e não era só devido à proximidade, mas sobretudo ao convívio diário que mantinham na Carbonífera e que solidificava profundamente as amizades; por todas estas envolvências, o adversário natural só poderia ser Pedorido, que, quando contactado, logo aceitou, tanto mais que o referido jogo iria ser disputado no seu improvisado campo, entre o Arda e o Douro, como era habitual...
Foi das maiores enchentes que ali aconteceram! Era um ambiente de festa, que ultrapassava o jogo em si, e, recordamos, que de Oliveira do Arda veio um apoio extraordinário à sua equipa, como nunca se vira!... Só que as coisas vieram a correr muito mal dentro das quatro linhas e a festa foi estragada, quando já na segunda parte, alguns dos jogadores se envolveram em pancadaria e Pedorido perdia já por 3-2! Este lamentável acontecimento impediria que o jogo chegasse ao fim, restando a consolação de que aquele desaforo não contagiasse os espectadores, que felizmente se mantiveram à margem do problema, abalando calmamente encosta acima, uns para regressar desiludidos a suas casas, outros "desligando" rapidamente e dispondo-se para uma perninha de dança no tal BAILARICO a que já fizemos referência; outros ainda para dar continuidade ao namorico, já que o dia era "ainda uma criança"; uma boa parte dos homens adultos seguia para "encostar" naquelas tabernas tão do seu agrado, onde esperavam encontrar aqueles com quem já era hábito disputar uns jogos de sueca, acompanhados com umas quantas canecas de um tinto verde e carrascão, que costumava deixar as suas marcas no interior do branco da porcelana...
Na semana que se seguiu ao jogo, não faltaram os comentários por toda a aldeia de Pedorido; as críticas eram unânimes à forma como um jogo amigável havia terminado e até alguns, que haviam feito parte da equipa, lamentavam o sucedido, até porque eram amigos, diziam, mas que agora já não havia nada a fazer, que o mal já estava feito, etc, etc,etc.É neste estado de espírito que o assunto é encarado no seio da população, pelas várias tabernas e claro nos mais variados locais de trabalho da Carbonífera; como não podia deixar de ser, o tema chega à barbearia e é ali amplamente discutido e a determinada altura surge a voz de um PEDORIDENSE, que decide tomar uma posição, que apanhou todos de surpresa:
- Não só reprovava o que acontecera no referido jogo, como também não concordava com as lamúrias dos infractores, que era, afinal, uma forma encapotada de se desresponsabilizarem, ao não assumirem a m.... que fizeram; não se podia ficar pelas "meias tintas" e defendia que se devia pedir desculpas públicas ao adversário, - leia-se Oliveira do Arda - convidá-los para novo jogo, para aí "acertar todas as agulhas" e assim restabelecer perante os dois públicos, a amizade que sempre existira entre povos vizinhos; ao mesmo tempo defendia, que era necessário fazer uma profunda remodelação na equipa de Pedorido, convocando outros jogadores, porque na sua opinião, havia que disciplinar e não premiar infractores!
Passou-se de imediato à acção e os Oliveirenses aceitaram as desculpas e aceitaram também fazer segundo jogo, que em pouco tempo foi levado à prática no mesmo terreno de jogo, ou seja, nas CONCAS.
O segundo encontro decorreu sem incidentes; Pedorido venceu com naturalidade por 5-1, utilizando uma equipa que muitos consideraram como sendo uma equipa de segunda, mas que cumpriu os objectivos a que se propôs!
Passados tantos anos é mais que justo, divulgar que o Pedoridense que esteve na origem desta bela atitude, que "deu a cara" e "meteu mãos à obra", retirando da lama o nome da terra que o vira nascer, chamava-se JOSÉ, era barbeiro de profissão e naquela tarde foi ao ponto de se equipar para capitanear a equipa, não fosse "o diabo tecê-las"...
Posteriormente a estes acontecimentos e quando na mesma BARBEARIA, onde em boa hora se havia feito luz, recordávamos estes factos e suas peripécias em que o "capitão" para um jogo e apenas por precaução, afirmava convicto:-« Fui para dentro do campo comandar aquela equipa, convencido de que era o jogador mais fraco e tenho consciência de que fui o responsável do golo que sofremos, quando já ganhávamos por 5-0...».
O"capitão" não era inocente e com os seus trinta e pico anos, sabia que na aldeia havia bons jogadores de futebol, só que eram traídos pela falta de maturidade, coisa que a ele não faltava... e demonstrara-o naquela disputa provocada pelo padre da paróquia, se bem se recordam...
Agora à distância, recordamos tais acontecimentos com muita saudade e apreciamos como foi bela, generosa e futurista, a atitude do ZÉ MARANTA, que teve ainda o sabor da humildade e do desprendimento, porque sabia que nada iria receber como contrapartida, como foi o caso!...

Moral da história: Só podemos dar aquilo que temos dentro de nós!... E quem nada tiver, nada poderá dar!

O nosso barbeiro, não mais voltou a envergar a camisola do clube da sua aldeia, nem mesmo para a capitanear e toda a gente percebeu, que só o fez naquele jogo, por uma questão de carácter e da dívida, que todos temos, para com a terra que nos vê nascer e à qual pertencemos até ao fim!


OBRIGADO "CAPITÃO"! OBRIGADO ZÉ!

RECORDAR É VIVER DUASVEZES!

UM GRANDE ABRAÇO PARA PEDORIDO E PARA OLIVEIRA DO ARDA!

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

..Os Rios, o Futebol e outras "rasteirices" humanas... ( 1ª parte )

Os meses de Verão, nos anos de Cinquenta e Sessenta, proporcionavam uma mais intensa actividade no futebol amador, entre as aldeias vizinhas.
Em Pedorido, não se fugia à regra e ali mesmo, onde o Arda terminava o seu percurso, surgia aquele tapete de lodo já solidificado, aqui e ali com alguma grama, transformado em campo de futebol; este pequeno espaço, mesmo encostado ao areal, era como que o resultado natural do afastamento do caudal do Douro, empurrado pela seca às fragas da Penela, ali mesmo em frente, na margem direita, deixando a descoberto um extenso areal do lado do Arda e que causava todo aquele encanto e um belo contraste, com o tão apreciado Choupal das Concas, onde também sobressaíam as nogueiras e os castanheiros, árvores quase centenárias, que convidavam ao passeio e ao desfrute duma beleza tão natural, que faziam daquele espaço, o mais romântico da aldeia e nem se conhecia nas aldeias mais próximas, outro local que rivalizasse sequer com a sua beleza!
Claro, que nem todos ocupavam as tardes desses já longínquos domingos da mesma forma!...
A maior parte assistia entusiasmada à renhida partida de futebol, colocando-se estrategicamente num ponto ligeiramente elevado, ali mesmo em cima do acontecimento e de costas para o Choupal, não tirando os olhos do que ia acontecendo no improvisado campo e podendo ainda mirar todo o movimento de automóveis, que na marginal da outra banda começara a ter bastante significado, aos fins de semana, a partir de meados dos anos Cinquenta!
Isto quereria significar que as gentes do Porto, Gaia e outras, descobriam finalmente, o interesse que as zonas ribeirinhas do Douro representavam para as suas horas de lazer e que passava a ser mais uma alternativa às suas praias atlânticas; ali na aldeia, havia quem não prescindisse da pesca no Grande Rio, nem que domingo fosse, era como que uma outra paixão, que desde miúdos alimentavam e que só por morte, ou por outra razão de força maior seriam capazes de pôr de lado; não seria um simples jogo de futebol, mesmo que um dos sobrinhos alinhasse pela equipa da sua aldeia, uma razão forte para o desviar daquela tarefa domingueira, até porque mesmo antes da noite, teria todas as informações acerca do resultado e das peripécias, que sempre acontecem nestes jogos entre equipas vizinhas; os pequenos lavradores, normalmente, optavam pela ida ao futebol, mas não prescindiam de uma passagem por algum dos bocados de terra, que ora ficava na ribeira do Arda, ora no alto da Parada, ou até lá para os lados do Picão; os mineiros eram assíduos, pouco faltosos e vibravam com as jogadas dos miúdos mais habilidosos, aliás, parte da equipa era composta por mineiros que desde muito novos não deixaram de comparecer no velhinho campo de saibro, lá na fronteira com a Póvoa, maravilhados com a técnica e o saber do velhinho húngaro Zanos Zorgo, que aqui relembramos!...
Os pares de namorados tinham nas tardes de domingo o ponto mais alto da semana e havia que aproveitar bem o tempo! Havia mesmo quem utilizasse as travessias de barco, na esperança de encontrar na outra margem, o amor que ainda não tinha vislumbrado na sua querida aldeia, enquanto que outros namoros já mais sólidos, também optavam pela mudança de ares, fazendo a travessia do Douro, para desfrutar de todo aquele cenário que o rio proporcionava, ao mesmo tempo que usufruiam duma outra liberdade e de um à vontade, que nem sempre era conseguido nas suas aldeias!
As Concas ganhavam na preferência dos jovens casalinhos e as razões estavam à vista:- Era um local muito acolhedor e um espaço onde se respirava um certo romantismo e que beneficiava de temperaturas amenas no pico do Verão, em resultado do arvoredo de que já falamos, mas também indo beneficiar e muito de toda aquela envolvência que o Arda e o Douro lhe transmitiam!...
Era certo e sabido, que assim que terminasse o jogo de futebol, os promotores habituais dos bailaricos arrancavam cá em cima, junto da velha serração, com o reportório, que sendo já conhecido, servia de suporte e chamamento às danças habituais e que naquele dia só atrasaram umas horas devido ao futebol; o jogo agora já era outro e os intervenientes mudaram radicalmente e o futebol passara à história... O acordeão, a viola e o minúsculo cavaquinho não davam tréguas e se no início eram três ou quatro pares de dançarinos, logo que a multidão atingia o local do bailarico, o número de pares multiplicava-se e por consequência a roda alargava o suficiente para dar espaço ao vira do Minho, que nem a propósito " obrigava " toda aquela juventude a um ritmo endiabrado e ninguém queria "ficar mal na fotografia"... A apreciar este cenário, por fora, apareciam sempre alguns mais idosos, homens e mulheres, como que a matar saudades dos tempos da sua juventude e que entretanto passara, mas que deixou as marcas de alguma saudade!... Assim que começasse a debandada dos dançarinos, o baile era encerrado, mas ficava prometido pelos músicos amadores, que voltariam no domingo próximo e seguintes...

Tudo quanto narramos até aqui inseria-se perfeitamente dentro dos padrões que na época se pautavam pela sã convivência e pelo respeito que coexistiam no seio deste tipo de sociedades trabalhadoras e pacíficas, para quem o dia a dia não era "pera doce", mas que suportavam com muita dignidade! O domingo era como que a compensação mínima de semanas laboriosas e de uma certa desumanização, uma vez que se tratava de trabalhos duros e de alguma violência física, quer se tratasse nas minas em Germunde ou no Fojo, ou mesmo na agricultura de subsistência em todas as aldeias do Couto Mineiro.
Mas como "uma desgraça nunca vem só", esta linda aldeia na foz do Arda, vivia um outro tormento, que corroía as suas entranhas e lhe ia retirando, lenta mas continuadamente, a dignidade que fazia parte da sua matriz; tudo isto tivera origem num plano orquestrado pela cabeça de um padre, que após ser bem acolhido pela paróquia, resolvera nomear-se como que o "controleiro" da vida privada de toda a gente humilde, infernizando pela "calada" a vida de muitas pessoas... Apenas escapavam ao controle os mais abastados e que na época eram escassos!...
Por aqui ficamos a perceber, que a espionagem ao serviço do abade tivera que redobrar de atenção naquela já longínqua tarde de domingo, em que a juventude da aldeia estivera particularmente activa em várias frentes:- a) Primeiro, porque o futebol mobilizara uma pequena multidão e as multidões complicam, criam até embaraço e despistam espiões com alguma experiência... b) Segundo, porque o bailarico poderia dar lugar a situações bastante "criativas" e por isso mesmo de muito interesse para a causa a que consciente ou inconscientemente aderiram; c) Terceiro, porque a dispersão dos pares de namorados era grande e a juntar a tais dificuldades, ainda poderiam perder de vista aqueles pares, que, em devido tempo, haviam passado de barco para a outra margem e a quem não queriam perder o rasto, de modo algum...
À primeira vista, todo este emaranhado de situações resultariam num cenário complicado para espiões "amadores", mas tinham que se desunhar, para, logo que possível, levar até ao "chefe", senão todas, pelo menos as últimas informações, que actualizariam os casos que vinham a ser seguidos e que de forma alguma poderiam ficar em branco, numa tarde tão rica em movimentações!...
Sabia-se que do futebol não vinha o mal ao mundo, apenas poderia dar aso a umas entradas mais violentas, ou a uns palavrões que ofendiam não o próprio, mas algum familiar de que se gosta muito, mas no geral não passava disso; mas os "espias" tinham que ter "cuidados" redobrados, porque podia dar oportunidade para outros "encontros", porventura mais amorosos e aquele abade convivia muito mal com os AMORES dos humildes, que, embora o fossem, afinal, também tinham todo o direito à FELICIDADE! Ou será que NÃO?!
O grande problema é que aquela boa gente estava a ser controlada pelo Fascismo, numa "santa" aliança com uma Igreja milenar, mas que se deixara enredar pelos interesses mesquinhos de pessoas sem escrúpulos, que da capital tratavam do País como se fora uma sua QUINTA!
Esqueceu-se essa gentinha dum pequeno mas importante pormenor: - NUNCA SERÁ FÁCIL DOMINAR UM POVO COM MAIS DE OITOCENTOS ANOS DE HISTÓRIA!!!!

quarta-feira, 18 de novembro de 2009

Homem simples mas FIRME! Merece ser Recordado!...

Era o mais novo dos irmãos e aos dezoito anos resolveu estrear-se como mineiro em Germunde, por pensar, que chegara a altura certa de arranjar alguma independência financeira, que não tinha no dia a dia duma lavoura de subsistência a que os seus pais davam continuidade...

A incorporação militar no quartel militar da Serra do Pilar veio interromper tão audaciosa profissão de mineiro, ao mesmo tempo que lhe dava a possibilidade de aperfeiçoar os conhecimentos práticos que desenvolvera na barbearia de seu pai, numa velha sala sem condições e com ferramentas toscas e primitivas, causadoras, por isso, de algum desconforto aos clientes daquela aldeia ...
Assim que termina o serviço militar, regressa em definitivo a Pedorido, mas agora mais maduro, com novas ideias em relação ao seu futuro e também mais apto profissionalmente, porque praticara a tempo inteiro em cortes de cabelo e em barbas mais exigentes e os contactos com toda a oficialidade daquele quartel deram-lhe uma outra tarimba para regressar, mas muito mais capaz! Por sorte, na década de CINQUENTA a sua aldeia era o centro nevrálgico do Couto Mineiro e o nosso homem decide dedicar-se por inteiro à profissão de barbeiro; constrói uma nova, mas pequena barbearia no prolongamento da velha casa dos pais, com quem ficara a morar e nunca descurando com estes do cultivo das terras. Naturalmente, que não rejeita a clientela do progenitor e junta-lhe agora uns tantos escriturários da Carbonífera, jogadores de futebol, segura e alarga toda a juventude da terra e até de aldeias vizinhas e dá especial atenção a clientes domiciliários.
Um desses domicílios era o abade da paróquia, que de tempos a tempos mandava recado por "correios" habituais e já muito conhecidos do nosso barbeiro, a marcar o dia e a hora em que deveria comparecer. Tudo rolava pelo melhor, mas um dia o bom relacionamento com o padre iria ter um fim! Sem que nada o fizesse prever as coisas aconteceram ... quando um dos " moços de recados" do abade combina a data e a hora para o habitual domicílio na residência paroquial.
Não querem saber que o "ilustre" cliente se apresentara ao seu barbeiro já de cabelinho e barba aparadinhos?!... Era lógico que o assunto a tratar não era de índole profissional, porque o abade descobrira por uma espécie de pide, que com o tempo montara na aldeia e que trouxera ao seu conhecimento de que o barbeiro solteirão, também andaria a "pisar o risco" da moral e dos bons costumes!... Afinal, quem mandava e decidia naquela linda aldeia do ARDA?! O autoritarismo do dono da igreja e do rebanho, deu aso a violenta discussão no interior da residência a que só terá assistido a empregada de serviço...
Claro que as homilias seguintes do padre trouxeram a desavença para a praça pública, como era muito habitual desta figura, que não se cansava de vociferar contra o "prevaricador" sem nunca pronunciar o seu nome; entretanto, já tinha dito o esssencial para que toda a aldeia ficasse "esclarecida"... Enquanto isto o nosso barbeiro desliga totalmente do assunto, deixa de ser cliente da igreja, continua virado para a sua dupla tarefa, ou seja, da barbearia e do cultivo dos campos e continua a manter a mesma postura e a mesma atitude com todas as pessoas da referida aldeia!
Para acicatar ainda mais o homem da batina e da coroa, resolve viver maritalmente à revelia da igreja católica, trazendo da aldeia vizinha a sua noiva, que muito naturalmente com o andar dos anos o presenteou com vários filhos; a união entre os dois era mesmo para valer!...
Voltaram as inflamadas homilias, carregadas de ódio, que duraram alguns domingos, mas que não tiveram quaisquer resultados práticos! Se o padre era pequenote no tamanho, mas destemido no propósito, o barbeiro era também valente e dono de forte personalidade, do melhor que na época havia na aldeia... De resto, os clientes da barbearia não deixaram de o ser, assim como se mantiveram os clientes que fazia aos domicílios. Com o tempo a coisa sossegou e o padre viu-se obrigado a "meter a viola no saco" e toda a aldeia percebeu, que o barbeiro foi dos poucos a ganhar uma disputa ao padre, mas foi preciso possuir uma têmpera forte e perceber, que tudo tem o seu limite, e, neste caso, o limite acontecera, quando uns anos antes o bom povo de Pedorido recebera confiante e de braços abertos um padre, que com o passar dos anos se viria a destacar, pelo péssimo contributo que veio dar a esta gente e por arrastamento à própria igreja católica, que representou até ao fim!
Exemplos?! Eles foram tantos que nem merece a pena enumerá-los!...
Entretanto, o nosso barbeiro já partiu, mas ficou o seu exemplo de verticalidade!
Merece ser recordado e a sua atitude firme, merece ser conhecida das gentes do futuro!

A MELHOR FORMA DE DAR A CONHECER A NOSSA TERRA É DIVULGÁ-LA!!!
UM ABRAÇO DO TAMANHO DO ARDA PARA PEDORIDO!

sábado, 14 de novembro de 2009

Duas aldeias, um Rio, duas formas de vida!...

Se fizer uma retrospectiva aos anos SESSENTA e recuando mesmo até finais dos anos QUARENTA, ou seja, àquele período pós 2ª guerra mundial ( anos de 1948, 1949, 1950 e seguintes) fico com a nítida impressão de ter vivido em países diferentes, o que não foi o caso... Estávamos no mesmo país, apenas o Douro separava estas duas localidades e era a fronteira natural, como ainda hoje é. Curiosamente, a religião era a mesma, com uma ligeira diferença, que não acrescentava nem tirava nada ao caso:- A aldeia da margem direita exibia uma pequena e humilde capela, enquanto na aldeia da outra margem era notório a imponência, pelo menos no exterior, de uma igreja nova, ali bem junto do rio, contrastando, de facto, com todas as freguesias e aldeias de todo o Couto Mineiro; esqueceram-se, sòmente, o mentor ou mentores de tal projecto, na ocasião, de um pormenor que lhes terá escapado, ou não; estou, naturalmente, a referir-me ao cemitério, que, mesmo ali ao lado, ficou como que o parente pobre de toda esta história e a marcar, talvez, até aos nossos dias, a falta de rigor e até de respeito para com a memória dos que nos antecedem! É curioso assinalar que na aldeia da outra margem, onde a capela era mais pequena e humilde, existia também um cemitério, mas que mantinha quase que uma perfeita harmonia com o meio envolvente, e que não se sobrepunha, nem diminuia à referida capela.
Sem pretender ser rigoroso porque tinha seis e sete anos, retive, alguns dados de alguma vivência nessa pequena aldeia, no sopé da Serra da Boneca, que, por ser pequena, nós os miúdos, corriamo-la duma ponta à outra... E, por ter sido assim, recordo que num dos limites da aldeia morava um homem com alguma idade e a quem chamavam Padre Manel; quero acreditar, que uma das ruas que hoje tem o nome de PADRE MANUEL, terá a ver com a mesma figura do homem que conheci em miúdo... Recordo, perfeitamente, que a estrada marginal era novinha em folha e com muito pouco trânsito, e, talvez por isso, a miudagem da aldeia jogava ali amiudadas vezes à bola e um pouco mais acima ficava a tal moradia do padre Manuel, e, creio que, mesmo ao lado, existia uma oficina, penso que de carpintaria, onde regularmente trabalhavam o referido abade, com cerca de meia dúzia de colaboradores, todos do pequeno lugar e que se dedicavam ao fabrico de colmeias.
Fiquei com a ideia de que este homem da igreja católica repartia a sua vida por estas duas funções, ou seja, como padre da pequena paróquia de Rio Mau e como profissional, ou artesão, na área da indústria do mel. Esta dupla actividade num padre, marcou-me muito positivamente pela vida fora, por considerar um bom exemplo de cidadania e que nunca mais me foi proporcionado ver!... Depois, fiquei ainda com a ideia bastante vincada, de que nos últimos anos da década de QUARENTA, Rio Mau tinha uma comunidade que vivia uma certa paz, bastante unida e que deixava transparecer uma boa disposição e até uma certa alegria, muito embora a vida das pessoas não fosse nada fácil! Não temos dados para garantir que foi tudo obra do padre Manuel, mas não nos custa admitir que também terá contribuido e muito para esta coesão como povo, porque de seguida a mesma igreja " lançou " outro tipo de padres, mais profissionais, sem duplas tarefas e isso pode ter feito a diferença!... Claro que nessas novas "fornadas " de padres também apareceu uma ou outra excepção; há sempre excepções em tudo, mas é terrível ter de assistir e suportar na nossa juventude, a atitudes continuadas de abuso de poder sobre povos, sobretudo sobre os mais humildes, que só mereciam ser compreendidos e ajudados a libertarem-se de uma cruz pesadíssima , que já vinha muito de trás, soubemo-lo mais tarde... Devo admitir que aprendi muito mais até aos sete anos com um velho padre que até nem falaria muito, mas que uniu e não dividiu e que deu como exemplo o trabalho honesto e continuado!
Temos por hábito em Portugal, procurar no estrangeiro os provérbios que nos costumam dar a inspiração para os bons exemplos, que achamos conveniente escutar e se possível seguir; estou a lembrar-me do provérbio chinês « Se o teu semelhante tiver fome não lhe dês o peixe que pescaste, ensina-o antes a pescar». Se estivéssemos mais atentos, não necessitávamos de ir tão longe buscar bons exemplos; temos aqui, mesmo à mão de semear, o exemplo do magnífico padre Manuel, que viveu e deixou obra de valor e de futuro em Rio Mau! Já agora, porque não se divulga aos mais jovens quem era este bondoso homem, como viveu e os exemplos que deixou e que ainda hoje estão a ser seguidos?! Se a igreja não o faz, porque não é levado a cabo pela Junta, pela Câmara ou mesmo por outras entidades públicas ou privadas? Dir-se-á que foi há muito tempo, mas que eu saiba os bons exemplos nunca passam de moda, porque são pedagógicos!...
Contava-se que o "nosso" homem dizia, sabiamente, a propósito das guerrinhas que iam acontecendo um pouco pelo mundo fora e que os jornais e a rádio ( não havia televisão! ) faziam chegar ao público:« ISTO COMEÇOU MAL, VAI ACABAR MAL!», desabafava em jeito de profecia...
Esta frase, diz-nos muito, e, diz-nos, sobretudo, uma coisa que não engana:- Era um homem de paz e que temia que os humanos nunca aprendessem com os erros da História e não arrepiassem caminho... Está tudo tão actual, relativamente a esse tema, que ainda hoje podemos perguntar:

«... SERÁ QUE NÃO VAI ACABAR MAL?!... »

Enquanto que em Rio Mau se vivia esta saudável realidade, na aldeia de Pedorido quase nada era comparável!... E porquê, se até teria as condições objectivas que Rio Mau não tinha?!
Vamos já ver porquê:-Vivia-se o período áureo da Carbonífera e Pedorido era o centro nevrálgico do Couto Mineiro! Pode-se mesmo afirmar, que embora a vila de Castelo de Paiva fosse a sede do Concelho, do ponto de vista financeiro a freguesia mais periférica ocupava o centro de decisão, por ser ali que pontificava a maior empresa e a que gerava mais riqueza!... Então o que faltava a Pedorido para que na próspera década de CINQUENTA, este povo não tivesse os níveis de felicidade que no dia a dia usufruia o povo de Rio Mau?! Naturalmente que as razões seriam várias e duvido que todas venham a ser conhecidas, mas uma das razões é segura e os factos comprovam-no:- À frente daquela paróquia havia sido colocada uma figura, que do ponto de vista humano, era como que o oposto do padre Manuel e que se preocupou no fundamental, em utilizar no dia a dia, a "velha" mas sempre muito utilizada fórmula « DIVIDIR PARA REINAR»!... Na época, a igreja católica tinha um peso ENORME sobre a vida das pessoas e o padre poderia desiquilibrar a balança; era como que a arma de dois gumes e aquela gente teve a infelicidade que não merecia; os factos são de uma evidência tal, que só uma grande aliança política entre o regime e a chefia daquela paróquia, explicam a vergonha com que impunemente se perseguia os mais humildes, utilizando processos e atitudes, que, ainda hoje, só de recordá-los, causam profundo mal estar nos cidadãos mais rigorosos no respeito pelo seu semelhante, sendo o desaforo ainda mais grave, se o desrespeito for cometido contra pessoas simples, que não conhecendo os seus direitos se tornam presas fáceis; mas, também é verdade, que os povos podem não ser muito cultos do ponto de vista académico, mas acabam sempre, mas sempre, por perceber quando foram ludibriados e usados e a "vingança" poderá tardar, mas não irá faltar:
-Em Rio Mau fala-se muitas vezes no padre Manuel e relembra-se o que fez de bom por aquela GENTE e como não se entenderia de outra forma, resolveram e bem, dar o seu nome a uma das ruas da aldeia! Foi um gesto nobre e bonito, que dignifica este povo!...
Na aldeia da outra margem do Douro, não se ouve nunca falar do tal padre que se esforçou tanto em dividir em vez de unir, nem conheço que tenham dado o seu nome a uma das ruas de Pedorido, e, nem nos blogs, o seu nome foi uma vez sequer citado...
CÁ SE FAZEM... CÁ SE PAGAM!
E convém nunca esquecer, para bem nosso, que o padre Manuel que viveu em Rio Mau e ali deixou bons exemplos e que ainda hoje perduram, já utilizava a inteligência e a paciência para ensinar os paroquianos a "pescar"! Ah, e muito importante, não era da CHINA!

Que pena, um Rio tão poderoso como o DOURO, não ter podido intervir e repôr também em Pedorido os níveis de felicidade que eram vividos pelas gentes de Rio Mau?!...
Afinal, os Rios não podem fazer o que só aos humanos compete!... E foi uma pena, UMA GRANDE PENA, porque naquela época as gentes de Pedorido, viviam, como que descaracterizadas, assim como numa espécie de hibernação humana!... E foi duro, porque doeu muito, e, pior ainda, deixou marcas nas gentes mais humildes da aldeia!


UM GRANDE ABRAÇO PARA PEDORIDO E RIO-MAU!

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

O rio Douro e dois bons exemplos!...

O Douro serpenteava por todo aquele vale depois de uma caminhada longínqua, dizia-se que de Espanha, mas fará hoje sentido pensar que grande parte das gentes ribeirinhas não teria uma ideia real das distâncias, nem conheceria outras pequenas parcelas do país a que pertencia, porque estavam todos muito ocupados numa luta diária pela sobrevivência deles e dos filhos, movimentando-se a pé ou de barco ou então conduzindo a junta de bois no rumo já habitual, com as tarefas que se tornavam já rotineiras de servir uma agricultura de subsistência e que nunca haveria de evoluir para outro melhor escalão!... Qual era o pescador do Douro, o lavrador, o barqueiro ou o mineiro que nas décadas de Trinta, Quarenta, Cinquenta e até Sessenta tinha condições para viajar e conhecer o SEU RIO até Barca d'Alba ou mesmo até à Régua?!...
Os barcos, todos os barcos eram feitos a pensar no trabalho para a sobrevivência deste povo vizinho do Grande Rio e na época nenhum barco era feito a pensar no lazer!.. Este pequeno barco desta minha curta história, não teria mais de cinco, seis metros de comprimento por dois de largura-apelidado de valboeiro- era utilizado para dois fins específicos: para todo o tipo de pescado de acordo com cada época sazonal e também era usado para a travessia de todas as pessoas que diàriamente, quer chovesse, quer fizesse sol, necessitavam deste transporte para chegar até um trabalho, num dos muitos que as minas de carvão ofereciam e que por vezes eram bem duros, bem como para outro tipo de objectivos que só era possível encontrar na outra margem, ou simplesmente porque havia um regular contacto entre as gentes das duas margens e que por via disso se conheciam muito bem... Porque as minas laboravam na margem esquerda e foram durante muitas décadas o maior empregador nesta vasta zona do Douro, acontecia que a maior clientela vinha da margem direita e o funcionamento destas travessias começava logo pelas seis, sete horas da manhã, durava todo o dia e prolongava-se pela noite dentro, porque os mineiros revezavam-se por dois turnos. Era muito habitual ver na travessia do Remoinho em Rio Mau, para lá da meia-noite, os pretendentes à travessia movimentarem a luz dos seus gasómetros da outra margem do rio, "chamamento" que se tornara um hábito a que os barqueiros de serviço correspondiam, tanto mais que quem aguardava na margem oposta não tinha comodidade alguma naquele ermo inclinado para o Douro... Nem um banco, nem um abrigo que fosse e porque regressavam de um trabalho árduo das minas, teriam ainda de aguardar cerca de vinte ou mesmo trinta minutos, até que o pequeno e ligeiro barco ali aportasse, para uma travessia que iria durar um tempo equivalente ao da espera, porque no rigor do Inverno e com mau tempo, não era" pera doce" ter de atravessá-lo nos dois sentidos e com o caudal na sua largura máxima! Eram pessoas audaciosas e de personalidade vincada, de não virarem a cara às grandes dificuldades, estas mulheres e homens que se fizeram barqueiros do Douro!...
É mais que justo neste preciso momento lembrar aqui duas mulheres de Rio Mau que durante anos e anos se dedicaram à difícil tarefa de "barqueiras" na travessia do Remoinho em Rio Mau, utilizando aquele pequeno barco e levando sempre a bom porto os muitos interessados em mudarem da margem direita para a margem esquerda e vice-versa! Já não me recordo dos seus nomes, só sei que seriam irmãs, que vestiam sempre de preto ( nunca lhes conheci outra roupa) e que chegaram ao ponto de salvar algumas vidas humanas, porque com tanta utilização do rio era quase inevitável os acidentes não se darem... O autor desta curta história também chegou a ser engolido pelas águas do Douro, bem lá para o meio do caudaloso rio, quando tinha cinco anos apenas e foi uma dessas duas irmãs, que me retirou duma morte mais que certa, apenas com uma das mãos e assim que apareci pela primeira vez à superfície, depois do aparatoso mergulho, porque me desiquilibrei do pequeno barco em movimento... Entretanto, já passaram mais de sessenta anos sobre tão triste episódio e que aqui registo, ao mesmo tempo que entendo ser meu dever dar a conhecer a fibra e a coragem destas duas mulheres, que se adaptaram duma forma notável a um trabalho difícil e de muito desgaste, prontas a decidir e a resolver qualquer problema que a profissão ou o próprio rio lhes viesse a colocar. Aqui deixo a minha singela homenagem e o meu profundo respeito, para com estas duas mulheres simples e que é justo aqui recordar!
Ao entrar na década de Cinquenta a minha família mudou-se para a outra margem e já a morar em Pedorido perdi o contacto com as "barqueiras" referidas na história, mas do outro lado do rio continuei atento e a ver com regularidade o mesmo desempenho das duas mulheres de negro, ora a caminho da margem esquerda, ora no sentido inverso... Aquele pequeno barco que parecia ser ainda o mesmo de anos atrás, movimentava-se como um pêndulo, da mesma forma de tempos idos e parecia deslizar pelos mesmos espaços e até as águas pareciam as mesmas!... Resta saber se as forças que imprimiam aos remos continuavam iguais, mas à distância notava-se que a personalidade e o empenho moravam ainda intactas naquelas criaturas... Duas grandes mulheres e mais dois bons exemplos que o Douro ajudou a descobrir!

Um grande abraço para Rio Mau!

Outro igualzinho para Pedorido!

domingo, 18 de outubro de 2009

O HOMEM mais as suas DÚVIDAS eternas !...

Há verdadeiras histórias, que quando éramos miúdos ou mesmo adolescentes, os professores , os pais ou alguém melhor posicionado na sociedade nos deveria ter contado. Isso não foi feito, as razões foram várias e agora sem recorrer a lamentações, que nada resolvem e só nos desfavorece, ainda vamos a tempo de sem pressas procurar perceber uma pequena parte do muito que haveria para ser contado.... e percebido!

Vamos desta vez procurar entender um pouco melhor o que se terá passado nas nossas "barbas":
- É um pouco estranho para o comum dos mortais, que um dia já distante do século VINTE, possivelmente, um pouco antes da 2ª Grande Guerra e seguramente depois da 1ª Guerra Mundial, que um indivíduo, oriundo do centro da Europa, venha até Portugal, adquira uma vasta zona de exclusividade para a exploração de carvão a quem foi atribuido o título:- ECD (Empresa Carbonífera do Douro L.da). Esse homem chamava-se JEAN TYSSEN e tinha a nacionalidade belga, tanto quanto se sabe, mas desconhecemos completamente de qual zona da Bélgica se tratava, uma vez que é um pequeno país, mas com três zonas e três lìnguas bem diferentes:- francês, flamengo e alemão. Em princípio, a sua naturalidade seria numa destas três zonas, mas o mais importante era conhecer o incidente ou incidentes que teriam estado na origem da sua vinda até ao nosso país, porque também é sabido que explorações mineiras na Bélgica e deste país até Portugal eram aos milhares e isso é que espanta!...
Seja como for, o nosso homem de negócios chegou até esta zona do Douro e chegou a ser por algum tempo a figura grada da Administração, muito embora nos parecesse não ser muito presente, talvez, porque a estrutura que veio a criar lhe desse essa permissa, uma vez que terá delegado no filho, esse sim mais presente, a residir algures no Estoril e que duma forma regular aparecia nas minas do Pejão.
Jean Tyssen apareceu muitas vezes em público na década de CINQUENTA, mas foram raras as vezes em que usou o discurso, talvez porque fosse avesso a esse tipo de comunicação ou por outras razões que desconhecemos e que para o caso também pouco importam... Mas a construção do Hospital em Oliveira do Arda, para todas as famílias do Couto Mineiro, foi um estrondoso sucesso e que deu muita FAMA à Carbonífera e todos nos recordamos da festa grandiosa levada a cabo aquando da sua inauguração! Não era caso para menos!...
Penso que não vou errar, ao divulgar que foi precisamente no calor desta festa, que Jean Tyssen usou da palavra e que os altifalantes espalharam por todo o exterior do novo Hospital e fazendo eco por aquelas colinas adjacentes ao Douro e ao Arda... A dada altura do discurso, o nosso homem num português com sotaque "estrangeirado", faz a seguinte afirmação:

-« Quando "MORER" quero vir para junto "DE" meus "MINEIRAS"»

Entretanto, os tempos iam passando, muita água o Douro e o Arda sem cessar permitiam que corresse para o Atlântico, como era seu compromisso e que sempre respeitaram, enquanto a labuta também continuava no interior e fora das minas! Naturalmente, que o pessoal das minas também trocava impressões e lembro-me perfeitamente de ouvir comentários convictos de que não acreditavam minimamente na afirmação do homem MAIOR e de certa forma LONGÍNQUO, quando dizia que quereria mais tarde "morar" com os mineiros... Não passava de retórica - diziam - e este convencimento até se compreendia, porque na época, os beirões, regra geral, eram fechados sobre si próprios e por via disso desenvolveram certo tipo de defesas, que, acreditavam, os ajudaria a viver ou a sobreviver melhor. De facto, era complicado num cenário tão real como aquele que se vivia em Portugal nos meados de Cinquenta, acreditar em afirmações dum senhor que mal conheciam, dono principal dum empório e naturalmente dono duma grande fortuna, convenhamos.
A história poderia ficar por aqui, mas não vai ficar, porque há novos elementos, que, felizmente consegui recolher, e, que, esses sim, completam parte das interrogações e das dúvidas aqui já contadas. Tomem atenção:
- No dia 17-10-2009, entrei despreocupado e sòzinho no cemitério de Oliveira do Arda e dirigi-me a uma senhora, que, muito concentrada, tratava de arranjar a sepultura de alguém muito querido, perguntando-lhe se não existiria naquele cemitério alguma sepultura com os restos mortais de algum membro da família Tyssen; a senhora foi muito amável e levou-me junto duma simples sepultura toda ela em granito, sem fotografia alguma e com os dizeres seguintes:

JEAN TYSSEN 27.03.1895 HOMEM BOM, AMIGO DOS
22.10.1965 SEUS OPERÁRIOS, JUNTO
DOS QUAIS DESEJOU
SER SEPULTADO.

HOMENAGEM DOS MINEIROS.

Faltará apenas acrescentar uma pequena inconfidência que a gentil senhora me deu a conhecer e que por amor à verdade não vou esconder. Disse-me a senhora:
-« Esta taça ( referindo-se à única taça que solta havia sido colocada sobre a pedra granítica) é enfeitada pelas várias senhoras, que regularmente vêm ao cemitério e que vão renovando as flores de acordo e a gosto de quem se prontifica a fazê-lo». É no mínimo um gesto BONITO!
P. S. Se repararmos nas datas, podemos concluir que no próximo dia 22 de Out. ( quinta-feira ) serão passados 44 anos sobre a data da morte do homem que em vida se chamou Jean Tyssen.
A concluir só resta acrescentar que o homem PROMETERA no seu discurso e outros mais tarde RESPEITARAM!... Agora jaz num dos cemitérios onde também repousam os corpos de muitos mineiros!

quarta-feira, 14 de outubro de 2009

PEDORIDO, a cultura e o desporto nas décadas de cinq. e sessenta!

A década de Cinquenta foi uma época de excepcional qualidade que Pedorido conheceu nas áreas cultural e desportiva. É justo assinalar o enorme êxito que foi a criação da Banda dos Mineiros em 1949 e o futebol, o atletismo e outros desportos como a natação que tinham uma actividade intensa e que eram praticados nas horas de lazer por uma quantidade razoável de profissionais da Carbonífera. Todos sabemos que todas estas actividades só foram possíveis devido à boa condição financeira da Companhia Belga e esta freguesia do Couto Mineiro era o centro nevrálgico, e, devido a esse factor, terá beneficiado à partida de toda uma exposição que outras freguesias não tinham. Assim os dois pequenos estádios que a Carbonífera mandou construir, a Casa da Música e a piscina foram deliberações que recairam sempre em Pedorido, porque também era óbvio, que do ponto de vista prático e económico, não poderia ser de outra forma, ou seja, a haver uma dispersão por mais freguesias tudo sairia muito mais caro e os resultados práticos com essa dispersão seriam sempre inferiores.

Apenas nos lembramos de duas importantes construções que não "nasceram" naquela freguesia; estamos a referir-nos à Cooperativa e ao Hospital que ficaram sediados em Oliveira do Arda, mas se repararmos melhor, verificamos que mesmo assim, a fixação foi ali, logo após o limite de Pedorido!... E se repararmos bem, vamos ainda encontrar uma outra explicação para a localização do Hospital naquele local e que fará todo o sentido e se prende com o facto de ficar mais ou menos a meio caminho entre a mina do Fôjo e a mina de Germunde. Parece-nos que esta localização fazia todo o sentido!
Se tivéssemos que catalogar por uma ordem todas as actividades aqui descritas, parece-nos que a Banda terá sido aquela cujo desempenho mais proveitos trouxe a todo o Couto Mineiro não só nas décadas de Cinquenta e Sessenta, mas ainda porque deu uma boa formação na área da música a muitos jovens e que lhes possibilitou fazer uma carreira profissional futura noutros pontos do País. A Banda do Pejão foi como que um viveiro na área da música e a fama e o proveito correu o nosso Portugal de lés a lés. Seria irrelevante tentar saber quanto se gastou para se pôr de pé uma Banda como a do Pejão, e, tendo em conta que atingiu um nível tão elevado, só por si os custos teriam sido largamente compensados pelos resultados obtidos! Nós não sabemos quem foi o mentor ou mentores que levaram a ideia até à família Tyssen que era quem em última instância aprovava ou desaprovava este tipo de projecto, mas tenho dúvidas que quem idealizou, soubesse de antemão do enorme êxito que lhe estava reservado para muito breve!... A pessoa, se é que foi alguém, merecia uma simples mas sincera homenagem!
As demais actividades culturais e desportivas também tiveram justificação, porque nem só do trabalho vive o Homem e no Atletismo cem por cento amador, houve mineiros que atingiram marcas que para o nosso país eram de considerar e especialmente no Norte rivalizava-se com o F.C. Porto. Era obra!...

Bem, no futebol também se gastou muitos dinheiros, mas não se atingiu o que seria possível e desejável, ou seja, a Música e até o Atletismo atingiram um outro patamar, basta comparar os resultados... Parece-nos que no futebol outros interesses se conjugaram e a partir daí os valores que iam despontando nas freguesias do Couto Mineiro não foram devidamente aproveitados e fica-nos pelo menos a ideia de que teria sido mais benéfico ter optado por equipas das nossas aldeias e apenas recorrer a dois ou três elementos do exterior que em minoria teriam que mostrar com trabalho o que valiam. Ora nunca foi esta a política seguida para o futebol no Pejão e todos nos lembramos que apenas dois ou três eram aproveitados para a equipa principal e a maioria vinha de outras paragens, com os resultados conhecidos. Resumindo, diríamos que apesar dos erros que se cometeram o balanço foi francamente positivo e temos de ter em atenção, convém não esquecer, que a Carbonífera era uma empresa privada, e, nestas coisas podia seguir o rumo que muito bem entendesse e como entendesse...

Vamos ficar por aqui com estas belas recordações e que não passam disso mesmo!...
Pedorido já teve uma grande projecção na cultura e até no desporto, precisamente há CINQUENTA anos!
No FUTURO vai-se lá saber?!...

sábado, 10 de outubro de 2009

HISTÓRIAS CURTAS: Valores e Ética!

A todo o instante estamos todos a fazer a História da Humanidade e os exemplos são de todo o tipo: são excelentes, são bons, são assim-assim, são maus, são péssimos... Durante muitos milhares de anos os humanos, ainda pouco inteligentes, lutavam apenas pela sobrevivência, imitando e até aprendendo com o resto do mundo animal. Foi uma aprendizagem longa mas muito proveitosa, cuja característica assentava numa prática nómada, sempre acompanhada de uma evolução cerebral muito lenta; a esta "travessia do deserto" de muitos milhares de anos,convencionou chamar-se de PRÉ-HISTÓRIA e os muitos estudos que têm sido feitos e que continuam a fazer-se, apontam claramente para uma conclusão: os humanos não evoluiram da mesma forma nas diferentes latitudes, e, isto é tão verdade, que já em pleno século XXI deu-se conta da existência de tribos, algures na floresta do PERÚ e que o mundo civilizado desconhecia em absoluto e com quem nunca houvera qualquer contacto...
Seguramente que estas tribos vivem organizadas, mas com um diferencial de MILHARES de anos para com boa parte dos povos do resto do planeta, que se auto-intitulam de civilizados e que seguramente adquiriram padrões de bem-estar, inimagináveis há bem poucos anos!
Como todos sabemos não há sociedades perfeitas e por conseguinte também não seria nestas sociedades primitivas do Perú ou da Amazónia que iríamos encontrar a tão desejada perfeição, muito embora não tenhamos dados que possam fazer com que afirmemos que serão povos infelizes, porque pode não ser o caso!... Estes estados de felicidade ou infelicidade não têm só a ver com os bens materiais, porque bem perto e dentro da nossa comunidade, é bem possível deparar com pessoas e até famílias que respiram saúde física e mental, que são a condição essencial para o tal equilíbrio que transmite felicidade, sem contudo terem vivido alguma vez para além dos conhecidos limites mínimos no que à riqueza diz respeito!
Em contra-partida uma grande parcela da comunidade vive a sonhar com uma felicidade que sempre lhe escapou e que também não saberá muito bem o que será, esperando com alguma esperança que se não for em vida, então que aconteça para lá desta existência, de que não guarda as melhores memórias, apesar de muita gente desta desfrutar ou ter desfrutado, por vezes, de condições de abastança, que alternaram com ciclos menos bons, diríamos até de necessidades básicas, com toda a família a "beber" a sua formação numa ausência de ética e de valores, que, esses sim, seriam os melhores alicerces para sobre eles poderem aspirar a uma vida de Felicidade CONSEGUIDA, que de outra forma lhes vai fugir, do mesmo modo que a enguia foge por entre os dedos dos humanos na eterna luta pela sobrevivência... e que para o conseguir sabe que só voltando ao Rio...

Os humanos devem ser avisados de que não vão chegar nunca ao estádio de felicidade terrena a que levianamente se propõem, se continuarem a persistir no ERRO em colocar de lado desde muito novinhos e em grande medida por culpa dos "educadores", os referenciados valores éticos, esses sim, tornam os homens e as mulheres VERDADEIRAMENTE GRANDES, e independente de serem ricos ou pobres, ministros ou operários, doutores ou desempregados, autarcas ou pescadores.Tudo o resto são títulos ocasionais e que se forem exercidos sem ética "ajudarão" as sociedades a caminhar para terrenos pantanosos, onde já nem as máquinas sofisticadas têm capacidade para executar "milagres" que tanto jeito davam!
Será sempre tempo de arrepiar caminho, mas os vícios e as vaidades humanas traem, depois de terem feito passar-se pelos melhores amigos do Homem, quando este devia saber que o melhor amigo do Homem, desde a Pré-História, foi e ainda é, aquele nobre animal chamado cão, amigo inseparável das estepes de há muitos milhares de anos e que ainda continua na sua luta pela sobrevivência sem deixar de ser leal e verdadeiro AMIGO!

Voltando ao mundo dos humanos, gostaria de vos dar a conhecer uma pequena passagem da minha vida, uma História Mínima como costumo chamar-lhe, uma pequena faceta, mas que viria a ter um GRANDE significado. Tomem nota:
- Estávamos no ano de 1955 e a minha excelente professora TERESA, natural de Pedorido, um belo dia resolveu falar comigo para me propôr uma espécie de "contrato". Disse-me a professora:- «Vais fazer a 4ª classe e é uma pena ficares parado! És muito novinho para o mundo do trabalho e por isso vou falar com os teus pais para que continuem a apostar em ti nos estudos. Se os teus pais não decidirem por esse lado, e se tu aceitares, vou propôr-lhes que no próximo ano lectivo continues a ajudar-me, porque vou cá continuar com uma outra turma da 4ª classe e vou ter muito trabalho. Se aceitares e como contra-partida da tua colaboração, no final do próximo ano, levar-te-ei à cidade do PORTO, ao Liceu Carolina Michaelis para aí fazeres o Exame de Admissão aos Liceus e os teus pais não têm que pagar rigorosamente nada».
Concordei com o que me fora proposto pela minha professora da 3ª e 4ª classe, porque acreditava que era uma profissional a sério e que melhor que eu próprio, sabia das minhas possibilidades e eu só tinha que ir em frente.
Claro que os meus pais concordaram com a segunda metade da proposta e durante aquele ano lá desempenhei, penso que bem, com a nobre missão de assistente da professora e no final desse ano lectivo na Cidade Invicta até dispensei da prova oral, o que prova que tudo fora bem pensado pela saudosa prof. TERESA!
O mais importante a reter de toda esta história é que com ONZE e DOZE anos lidei a sério com valores e ética que sempre me acompanharam e muito me ajudaram pela vida fora!...
Desde logo a questão da seriedade dos mais velhos para com as crianças; o prometer e cumprir, o valor da palavra dada pela professora ao jovem aluno, valor fundamental no dia a dia das sociedades e que se tem vindo a degradar, de cima para baixo e de baixo para cima; o esforço para a COMPETÊNCIA, o agarrar com PAIXÃO naquilo que pretendemos fazer bem, foi outro atributo que adquiri naquele longínquo ano de 1955 e que não viria mais a largar; o perceber que estava a ser observado por uma pessoa com qualificação e que acreditava no meu desempenho, deu-me responsabilidade e um grande entusiasmo, porque não podia falhar e vir a ter o sucesso que a competente professora de antemão nunca tinha posto em dúvida.
Estes factos são reais e devem ser divulgados para contrapôr às tais práticas sem sentido e que são o pão nosso de cada dia nos tempos actuais...
Não é difícil imaginar que os resultados ainda seriam melhores nesse outro Tempo, se o regime político em exercício, manifestasse outro interesse pela evolução das camadas populares, em vez de as mergulhar conscientemente no OBSCURANTISMO! Isso foi lamentável, mas como a mágoa nada resolve e só atrapalha, temos um largo futuro para com seriedade modificar para melhor o que herdamos de mal e nunca esquecer que mesmo em regimes de pouca credibilidade, é possível viver com ÉTICA para poder ser considerado Homem!

segunda-feira, 5 de outubro de 2009

Visita e Almoço no Alto da Serra da Boneca!...

Era já um hábito aqueles quatro casais se mobilizarem, a eles e aos filhos, em alguns domingos e nos melhores meses do ano, saírem de suas casas pela manhã, com o almoço devidamente acondicionado em cestas de verga, nunca esquecendo as bebidas, partirem a pé com destino a locais ao ar livre e já determinados, optando de preferência pela sombra das árvores, para aí estender as toalhas, e, de seguida saborear, aquela que seria a melhor refeição da semana!
Na época, estávamos no início dos anos CINQUENTA, trabalhava-se de Segunda a Sábado, em toda a Indústria Nacional e apenas se descansava ao Domingo, considerado como um dia "sagrado", quase...
A 2ª Guerra Mundial tinha terminado há pouco mais que meia dúzia de anos, grande parte da Europa tinha sido devastada, e, o nosso País, que ficara fora do conflito, tinha pela frente uma série de problemas, todos resultantes do sub-desenvolvimento em que havia mergulhado há décadas e que o Estado Novo, também não resolvera. Éramos um país pobre, em muitos aspectos, sem infra-estruturas capazes, com pouca indústria e incipiente, com uma taxa de analfabetismo elevada, com uma mortalidade infantil muito perto dos cinquenta por cento... As terras não eram devidamente cultivadas e por via disso, o resultado por hectare era incomparavelmente inferior à dos países que emergiam na Europa. O isolamento político do regime ditatorial completava a desgraça...
Ganhava-se muito mal, os trabalhos disponíveis eram pesados e a emigração era uma tábua de salvação para uma parte da população, só que era uma mão de obra não qualificada, porque essa qualificação neste país era coisa rara... Curiosamente, o regime de partido único não permitia, talvez por desconfiança, a emigração para as ex-colónias, em especial para Angola e Moçambique, e, esse, foi outro erro grave que também custou caro aos portugueses; não é que fosse a solução para os muitos problemas dos portugueses, até porque as ex-colónias sempre estiveram abandonadas à sua sorte, sem uma política de desenvolvimento e por conseguinte se não havia condições para os naturais, muito menos para receber colonos ou emigrantes...
É neste quadro negro que as minas no Pejão laboravam a todo o gás possível, com o fim de tirar das suas entranhas o carvão imprescindível às necessidades, porque a tecnologia em serviço no país , fora concebida para consumir este fóssil. Neste contexto, tinha tido início no pós-guerra, talvez, um dos melhores períodos da Companhia Carbonífera de capital belga. Havia ali muito trabalho, especialmente nas minas e como eram tarefas que exigiam pouca qualificação, o recrutamento era feito nas povoações do Couto Mineiro e nas suas redondezas; o pessoal mais especializado era recrutado noutros pontos do país e a quem era atribuído outras condições e melhores remunerações!
A provar este bom momento da Carbonífera, teve início no ano de 1949 um conjunto de actividades nas áreas da Cultura e do Desporto e que iam desde a música, alguma representação na área do teatro, projecção de cinema em alguns pontos do Couto Mineiro e ainda no futebol, atletismo, ciclismo, ténis e uns anos mais tarde na natação... Foi uma actividade cultural e desportiva sem precedentes naquela zona do Douro, e, será justo lembrar, que, na música, no atletismo e na natação, uma boa percentagem eram mesmo mineiros, ou que de alguma forma executavam tarefas ligadas à produção.
É neste contexto preciso, que os quatro chefes de família atrás referidos no início da história, fazendo parte dos activos da Carbonífera, se encontram regularmente executando tarefas de chefia intermédia de alguma responsabilidade, o que vai permitir que entre eles se estabeleça uma relação de amizade e sobretudo confiança, factor importante naquela época... Convém aqui referir que os portugueses duma maneira geral, cultivavam uma dose elevada de astúcia ou manha, como que a tentar compensar as falhas académicas, que eram naturais e também normais, uma vez que ninguém evolui sem as necessárias condições. Resumindo, eram as vítimas mas não eram os culpados!
Moram os quatro na mesma aldeia e a cerca de três quilómetros de Germunde, ponto fulcral e estratégico da Carbonífera, ali numa colina sobranceira ao Douro e por onde se escoava, através de barcaças construídas para esse fim, todo o carvão retirado das minas do Fôjo e Germunde e que seguiria desta última localidade para os mais variados destinos do território Nacional.
Por estas alturas, nos anos CINQUENTA, o tráfego diário no Douro era intenso... Por um lado era toda a azáfama dos RABELO, no vai-vem entre o vinhateiro Alto Douro e o Porto e Gaia e por outro era o vai-vem constante das Barcaças do Pejão entre Germunde e a Cidade Invicta!
É evidente que três dos quatro casais regulavam pelas mesmas idades e com os filhos sucedia o mesmo e por isso frequentavam a Primária na mesma Escola em Pedorido, que não tinha boas condições e seria um espanto se as tivesse... Se tudo viesse a desenhar-se dentro do que era habitual, dali a uns anos os rapazes iriam engrossar as fileiras da Carbonífera, enquanto as raparigas seguiriam o rumo das suas mães e tornar-se-iam boas donas de casa, assim se esperava, porque nada apontava para que viesse por aí alguma mudança, infelizmente.
Os anos vão passando, os cenários mantêm-se e atingimos o ano de 1953...
Mantinha-se a amizade entre os casais e de vez em quando o almoço domingueiro lá se concretizava, sempre em locais diferentes e um deles chegou a ter lugar em GAÍDO, um pequeno lugarejo do interior e pertencente à mesma freguesia!...

Até que naquele ano de 1953, talvez para fugir à rotina, vai-se lá saber porquê, os nossos personagens resolveram, desta vez, atravessar o Douro de barco para a outra margem, e já em Rio Mau iniciar a pé uma subida enorme e difícil, até atingir o ponto mais elevado da Serra da Boneca, e bem lá no alto, saborear aquele apetecível almoço domingueiro, mas, desta vez, tendo pela frente não só um cenário, mas vários, era só escolher, dependeria do gosto dos que haviam cortado a "meta" e foram todos da comitiva!`
A esta distância, tenho algumas ideias do que presenciei e que ficou em mim gravado:- «Desde logo atingimos com o olhar áreas enormes, muito casario distribuido duma forma desordenada, dentro dum enorme espaço verde e que contrasta naturalmente; uma cadeia de montes em zigue-zague, em que uns sobressaem e dão nas vistas, também pela proximidade como é o caso do monte de S. Domingos, e por último destacava-se lá no fundo o Douro e as suas águas pouco límpidas, mais os seus inseparáveis areais e que fazem um contraste natural com toda a mancha verde do arvoredo diversificado e que o envolve, quase esconde o RIO, ou será que quer sòmente protegê-lo?... Na verdade, não são só os montes que fazem os tais zigue-zagues ou que serpenteiam; o Douro faz precisamente o mesmo e serpenteia desde as longínquas terras de Espanha em caminhada veloz a caminho do litoral e da terra lusitana, aspirando chegar ao mar ATLÂNTICO, afim de completar a principal tarefa de que foi incumbido há milhões de anos e que é de completar todo o seu ciclo. Teremos todos de concordar que o Douro merece de nós, humanos, admiração e respeito, porque sempre fez bem a sua principal missão, a de completar o seu ciclo no Atlântico! Será por tudo isto que há quem afirme que OS RIOS SÃO ETERNOS?!.
Talvez, porque se tratasse duma caminhada mais longa e sobretudo mais difícil que as anteriores, os mentores resolveram desta vez, alargar o convite a mais pessoas e assim seriam TRINTA ou um pouco mais! Uma boa parte eram crianças, e, por via disso, resolveram "atacar" a Boneca da seguinte forma:- Dividiam-se em dois grupos; o grupo das crianças e das mulheres subiria por uma zona que achavam ser mais directa e mais fácil, sempre acompanhados por pessoa amiga de Rio Mau, chamado ORLANDO SOUSA, ainda vivo felizmente e que conhecia não só toda a subida, mas também o ponto de encontro com o segundo grupo; eu próprio, contador da história e que só tinha dez anos, naturalmente, fiz parte do primeiro grupo; o segundo grupo, composto por homens, levava também um guia e que era seguramente de Rio Mau, mas que já não consigo recordar... Este segundo grupo pretendia "atacar" a Serra pela vertente mais difícil, que era seguir parte do percurso mais importante do ribeiro e que dá pelo nome de rio Mau, donde a povoação vai "beber" o nome e acompanhá-lo para montante desde a Levada, passando pelo Poço Negro,pela Estivada, onde pontificavam os moinhos movidos pelas águas deste pequeno afluente do DOURO e que com o seu trabalho intenso, deveriam produzir toda a farinha e o PÃO necessário às três localidades da margem direita: Rio Mau, Sebolido e até Melres! Este segundo grupo, a determinada altura do percurso deixaria de acompanhar o curso do ribeiro e tomaria uma outra rota, com o objectivo de se encontrar com o nosso grupo; o essencial terá corrido dentro do previsto e os grupos lá se encontraram, ali às portas duma pequena localidade chamada CABROELO e a partir dali encetamos uma travessia de sentido ascendente, procurando chegar ao ponto mais elevado da BONECA, onde existe um marco como referência. Não foi nada fácil, esta parte final até à "meta", lá no alto, não só porque todos estariam já bastante cansados, mas porque não existia um caminho, ou mesmo um carreirito, desajeitado que fosse e que suavizaria as dificuldades até ao cume. Resultou, por isso que as crianças sentiram e de que maneira as dificuldades do terreno e houve que recorrer a recursos como gatinhar, trepar obstáculos, contornar por fora algumas elevações de ardósia solta e que criaram muito embaraço...
Finalmente, todos atingiram o cume da Serra e ninguém se magoou a sério da aventura que os adultos a todos arranjaram, com mais razão de queixa para as crianças... Seguiu-se de imediato a escolha do local para estender as toalhas, mesmo que fosse preciso improvisar, colocar os pratos, os talheres e os copos da bebida, sempre fundamental nestas circunstâncias e sem cerimónia e num ambiente de muita alegria, dar início ao melhor almoço, que todos os presentes até àquele domingo haviam saboreado: ALMOÇAR NO PONTO MAIS ALTO DA BONECA!
Tenho uma vaga ideia, porque muitas coisas se perdem da nossa MEMÓRIA, mas neste preciso momento do almoço, nenhum trocou as lindas paisagens pela comida!... Tudo isso ficou para depois, quando a disposição melhorou e houve até direito à fotografia colectiva, lá bem no alto da Serra e que ficará a atestar que não foi um sonho de um qualquer, mas um acontecimento real e que não voltaram a repetir, vai-se lá saber porquê?!...
Passaram já CINQUENTA e SEIS ANOS sobre aquela data! Quem haveria de dizer!...
Os quatro chefes de família que estiveram na origem destes acontecimentos foram desaparecendo e só nos resta a lembrança e muita saudade, e, tudo isso, irá também um dia morrer connosco, inexoravelmente...
Do restante colectivo, só um ou outro terá desaparecido, felizmente a maior parte está aí para recordar, se for o caso e quem sabe, poder ainda voltar à Serra da Boneca e dali usufruir ainda com mais liberdade, com a LIBERDADE que ABRIL veio possibilitar e dar a conhecer, que os HOMENS poderão ser ainda mais IGUAIS nas DIFERENÇAS, que são óbvias e salutares!

Pensemos todos nisso!

UM ABRAÇO DO TAMANHO DA BONECA PARA RIO MAU E PEDORIDO!

domingo, 27 de setembro de 2009

Hist. Mínimas: Revisitei Rio-Mau em Set.bro (2ªparte)

Assim que terminei o almoço deixei a Foz e segui para a zona mais central de Rio Mau, mais precisamente junto à Sobreira, aquele lugar que guardo na memória, dos fins dos anos QUARENTA, onde os rapazes adolescentes da época se juntavam para diálogos muito amistosos, à mistura com gargalhadas e que se ouviam à distância, no final de cada dia, depois de mais um dia de trabalho.
Naturalmente, que já terão passado SESSENTA ANOS, mas importa registar tudo quanto nos marcou para o resto da vida, sobretudo, se no resto do nosso percurso tivemos a desdita de deparar com outros exemplos, que não sendo iguais aos que presenciei em Rio Mau, não têm sequer semelhança.
Em Rio Mau, com seis e sete anos, registei momentos e acontecimentos que me acompanharam pela vida fora. Foram exemplos de amizade, companheirismo e solidariedade desses jovens, que irradiavam um certo tipo de amor fraternal; foi o contacto por perto, com o padre Manuel, que, para além de abade, muito pacífico, era antes do mais trabalhador, muito interessado na feitura das colmeias, juntamente com os demais trabalhadores, das futuras moradias das abelhas, onde se esperava, viessem a fabricar o Mel, delicioso néctar, de que os humanos gostam de se apropriar, por necessidade e pelo prazer dos açucares ; foi ainda o HUMANISMO, a ÉTICA e o SABER do padre Manuel, que teve sempre a arte e o engenho de apontar às pessoas daquele pequeno meio, que, só através do trabalho honesto, no dia a dia, estariam a investir na forma mais correcta para serem felizes e também úteis à sociedade. Dessa Igreja, confesso, sinto ainda hoje a falta, porque estes exemplos, são de um realismo, que não precisa de palavras para ver passada a mensagem, porque o conteúdo é acessível, toda a gente percebe. A socidade necessita de agarrar estes valores e é indiferente se lhes são transmitidos por religiosos ou não, porque só por si, a demagogia e o oportunismo não têm raizes fortes e saudáveis, logo, perdem consistência, definham e o falhanço será mais que certo. A história dos homens está cheia de tristes exemplos!...
Estou em crer, que alguns dos êxitos que Rio Mau obteve nos últimos TRINTA, QUARENTA anos, se ficou a dever ao facto de ter ido " BEBER " a essas fontes de bons exemplos que atrás enunciamos! Era tudo uma questão de tempo, bastaria mudar de paradigma e havia excelentes condições no terreno para que fosse possível a transformação que se desejava.

Quero agora contar-vos um caso que conheci pessoalmente e que ajuda a confirmar as minhas convicções:
Estávamos no ano de 1981 e fui encontrar numa empresa química de Estarreja, que estava a ser construida, várias inscrições gravadas no solo, alusivas a RIO MAU e que me levaram a procurar nas várias empresas que ali operavam, na expectativa de poder encontrar conterrâneos meus, que poderia até conhecer, ou não. Efectivamente, lá encontrei os CANECAS, um outro jovem soldador de nome RUI, um outro chamado PEGAS, natural de MOREIRA e ainda outros de que já não recordo os nomes. A verdade é que estavam ali de Segunda a Sexta e durante anos a lutar pela vida, e, mais uma vez, tive a oportunidade de comprovar, que entre eles continuava aquela chama de companheirismo e de ajuda mútua, como conhecera há trinta anos atrás! Não notei qualquer diferença e lá veio de novo à minha lembrança a figura do Padre Manuel que muito terá contribuido para que este " Milagre " ainda aconteça com as gentes de Rio Mau.
É neste estado de espírito que chego à zona da Sobreira, naturalmente muito diferente de outrora. Do lado oposto e em todo o correr já não existem os campos de cultivo de que ainda me lembro... Deram lugar a cafés e a outro tipo de construção, resultante do crescimento, entretanto verificado em Rio Mau, que passou de um simples Lugar para Freguesia e a História vai registando os passos, que vão sendo dados, por esta gente de espírito sempre jovem, que persiste em manter a sua matriz e que tem brio em preservar as suas MEMÓRIAS, que são o seu alimento e o " SEGREDO " para vencer as dificuldades e ir em frente, com o sucesso que todos lhe reconhecem e que está à vista!... É um povo que demonstra no dia a dia que está de bem consigo próprio, que vive sem azedume, mesmo quando surgem as dificuldades e isso está espelhado na alegria que deixam transparecer nas conversas simples e que até contagia!... Não será por acaso que um vizinho muito atento de Rio Mau ao caracterizar este povo, dizia mais palavra menos palavra o seguinte:- « ... COMO EU GOSTARIA QUE OS MEUS CONTERRÂNEOS FOSSEM UNIDOS COMO ESTE POVO DE RIO MAU!... »
Parece-me, que este desabafo, dito em tom magoado e nostálgico encerra uma verdade que até os cegos são capazes de ver!...

Não foi difícil encontrar alguns dos meus " velhos " amigos. Um a um, iam chegando junto do café da BANDA, ponto de encontro para a conversa, ler o jornal e tomar o café a seguir ao almoço.
A uma certa distância consigo descortinar o " Benfica, " rapaz do meu tempo e com quem tive o previlégio de jogar futebol, ainda no antigo Pejão, decorria o ano de 1965... Foi um encontro de grandes amigos, e, a seguir, outros iam chegando:- o Manuel Carvalho ( Marau ), o " velho " Mota, defesa aplicado, o Arlindo, guarda-redes, mais conhecido por " Borrachinha, " e o Zé Abílio que no atletismo deu cartas no lançamento do dardo e do disco! Conversamos com a mesma franqueza dos tempos passados, sem tecnicismos e vi nos olhos de alguns aquela emoção própria dos melhores momentos das nossas vidas!... Conversei ainda com os bons amigos Neves e Valdemar a quem no final dos anos QUARENTA apelidavam de Stálin e que tem agora SETENTA e CINCO anos!
O Manuel Carvalho e o " Benfica " tiveram ainda a amabilidade de me levarem até ao Ribeiro, de quem guardo muitas recordações, mas confesso que encontrei grandes diferenças, não só no ribeiro, mas sobretudo no meio envolvente... Gostei do novo espaço que está a ser perspectivado para festas e outros eventos, e, acho óptima, a ideia daquela reconstrução para a futura biblioteca!
De conversa em conversa, tive a grata surpresa de tomar conhecimento de que Manuel Araújo da Cunha, era também de Rio Mau e morava na freguesia. Quis conhecer este ilustre conterrâneo, dizer-lhe pessoalmente que aprecio muito do que tem publicado na Internet, que admiro bastante o seu estilo, e, que, gosto, particularmente da causa que vem defendendo em toda a sua OBRA: A REGIÃO do DOURO! Assim, desta forma natural e simples, vamos encontrando no nosso caminho, a caminhada de outros que também à sua maneira vão fazendo um trabalho sério, honesto e que é pouco reconhecido, e, acontece, quase sempre, surgir alguma lembrança, já tardiamente,de preferência depois do desenlance fatal, muito à " boa maneira portuguesa "...
A verdade é que a terra vai necessitar sempre de ser regada, mas está já adubada e por aí quase que poderíamos dormir descansados, mas é mais prudente não ir por aí, porque há tanto a fazer!... Depois as lembranças dos exemplos do Padre Manuel, do Ricardo Sousa, do Marques Sopa (já falecidos) e dos Canecas, do Rui ( jovem soldador em 1981), do Manuel Cunha, do António Monteiro e de tantos que não conheço, mas que existem e que estão a dar o seu melhor, são a garantia de que esta gente vai continuar a dar a volta por cima, como já o vem fazendo há CENTENAS de anos, se forem correctas as informações escritas acerca do povo de Rio Mau!...

Quero voltar em breve a Rio Mau para novo reencontro, mas desta vez, queria muito encontrar o Orlando Sousa e o António Monteiro, de quem me desencontrei desde os anos SESSENTA e que recordo com muita saudade, pela amizade fraterna que sabia transmitir e também pelo gozo que era, ouvir de viva voz, as lindas quadras sobre as povoações ribeirinhas, sem nunca esquecer o DOURO de milhões de anos!
Foi um prazer enorme estar convosco e voltar às minhas origens, onde tudo começou para mim e o começo foi em RIO MAU; faço questão de relembrar a mim próprio este facto, e, muitas vezes, nas minhas conversas com outras pessoas, vou buscar alguns dos temas que aqui temos aflorado e que damos como exemplos, e, todos, sem excepção, gostam do que ouvem e ficam encantados com as HISTÓRIAS CURTAS ou MÍNIMAS sobre Rio Mau e a sua gente!
Só quem se afastou voluntariamente dos seus amigos sabe o quanto custa viver separado!...


UM ABRAÇO DO TAMANHO DA SERRA DA BONECA PARA RIO MAU !

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Histórias Mínimas: Revisitei Rio-Mau em Setembro!... ( 1ª Parte )

Há alguns dias voltei a Rio Mau e porquê?!
A verdade é que aspirava voltar àquela bonita aldeia, e, se o não fiz antes, foi porque demos prioridade a coisas que nos ocuparam em demasia, e, que, em boa verdade, algumas delas, nem seriam de interesse relevante!
O chamamento era forte e a felicidade não podia ser mais adiada! Tentei prever os passos que iria dar nos dias que antecederam a minha partida, mas desconhecia quem iria encontrar dos bons velhos tempos, embora não tivesse preocupação quanto a isso, já que a boa hospitalidade é um dado adquirido daquela gente, para mais tratando-se dum filho da terra, como era o caso.
Fui direitinho à Foz e dali contemplei enternecido Pedorido na outra margem, que também é a aldeia que mora comigo, porque não é em vão que ali se vive até aos vinte anos!...
Mesmo que não quiséssemos, as recordações não paravam e eram muitas... Desde logo, senti o antagonismo do DOURO que conheci, mais estreito, como era seu hábito nos meses de Setembro, em que as águas eram sempre turvas, quase barrentas e onde todo o extenso areal chegava a ter maior expressão que o reduzido caudal do rio, já que se estendia lá de cima em frente de Rio Mau, continuava pela frente da Penela, ali bem defronte a Pedorido, e, onde já se podia verificar o nítido contraste entre a cor das águas do Douro com as do Arda, sempre tão límpidas e azuladas, e, que, teimosamente, se encostavam bem junto à margem esquerda, até para lá da Lingueta, retardando quanto possível a mistura das suas águas com as do Douro, o que só viria a permitir, lá mais para diante, junto a uma pesqueira e que no rigor do Verão, mais parecia um promontório, por ficar totalmente fora de água... Era aqui, um pouco mais acima, que pontificava a quinta de Fornelo, bem resguardada e também bem trabalhada e que devido à sua favorecida colocação no terreno, bem poderia apreciar os variados cenários que se iam sucedendo, mesmo ali à sua frente, visionar não só as metamorfoses em que o Douro era pródigo durante os doze meses do ano, mas ainda todo o vale que se esgotava lá longe no Remoinho em Rio Mau, portando-se como um observador sempre presente de todas as peripécias de que foi testemunha priviligiada, merecendo destaque as enormes dificuldades, que, todas as embarcações, em especial os barcos RABELO, sentiam, para transpôr aquele curto mas difícil " galheiro ," ali mesmo nas suas barbas, sabendo os barqueiros que dali até à Régua, o pior estava ainda por vencer, caso o abendiçoado vento marítimo não aparecesse a inflamar as velas remendadas, como tantas vezes sucedia!...
Era uma luta titânica , tanto a descida como a subida do Douro,levada a cabo por estes homens, que um dia se fizeram barqueiros de um Rio, que nunca os haveria de compreender...
Esta pequena quinta era como que um marco entre o Arda, Pedorido e Germunde, sendo, este, um lugar sombrio, de certa forma estranho e de muita labuta, e, onde, diariamente, centenas de trabalhadores se encontravam, para os mais variados trabalhos da Carbonífera, sendo, que, a maioria eram mineiros!... Na verdade, Germunde nunca nos pareceu um lugar acolhedor, por natureza, em que até o Sol entrava mal, com um terreno acidentado até ao Rio e onde imperava a cor negra do carvão por tudo quanto era sítio... Também não creio, que as gerações que por ali passaram questionassem a tal ausência de beleza do referido local, porque a missão que para lá os levava, diariamente, era de outra índole, e, tinha sobretudo a ver com a luta pela sobrevivência, e, essa, tinha e sempre terá muita força! Acontece, que a profissão de mineiro, era até de um grande risco!

Almocei na Foz, no único mas acolhedor restaurante que ali fui encontrar, mas durante todo o almoço não fui capaz de desviar o olhar da outra margem, e, só então pude perceber melhor, que, afinal, continuava muito dividido entre Pedorido e Rio Mau, o que pensando bem, é até muito natural! Foi nestas duas bonitas aldeias, como teimo carinhosamente em chamar-lhes, que aprendi o essencial, e, neste essencial, estou a englobar o muito bom e naturalmente o menos bom, de que ninguém se livra, mesmo os que nascem em berços dourados, que não foi o meu caso, felizmente o digo...
Tive, confesso, grande dificuldade em concentrar-me e as mudanças que fui observando também não vieram ajudar... As águas do Douro terão agora muito mais que o triplo da largura, os areais sumiram-se, a cor das suas águas também se modificaram, são de um azul muito próximo do azul do Arda e já não é perceptível a dupla identidade dos dois rios. Foram várias as perdas, e, perdeu-se, ainda, a BARCA no seu característico vai-vem, entre as duas margens e que era tão útil às populações ribeirinhas, e vi, por tudo isto, a tristeza aumentar, talvez, por perceber toda a impotência da minha parte em alterar de imediato o que já é uma impossibilidade!...
Claro, que, fiz um grande esforço mental para abandonar todos aqueles cenários e procurei ajuda na paisagem, algo, que me derpertasse de novo e me retirasse do desconforto em que havia caído. É então que " descubro " a altivez de uma nova ponte junto à foz do Arda, e, isso, veio como que alterar o meu estado de alma, por querer acreditar ainda que, poderemos estar a caminho de um " novo " tipo de desenvolvimento para benefício de todas as zonas ribeirinhas do Douro, beneficiando quem sempre aqui viveu e que tem verdadeiro amor à região.
Reparando melhor e no momento, parece-nos que as Concas, terá perdido a grandeza, a beleza, a alegria e até um certo romantismo de outrora e o nosso Arda, já não é aquele rio autónomo que conhecéramos e a sua RIBEIRA também já não existe...
Resta apenas, nas nossas cabeças, os belos cenários dos anos CINQUENTA e SESSENTA e o muito amor que tínhamos ao ARDA e à sua personalidade de rio interior e muito amigo das gentes de Pedorido! Foi um companheiro de caminhada de muitas gerações, perante as quais nos curvamos respeitosamente! Nunca será fácil mexer com as MEMÓRIAS!...
Que dizer, ainda da Ribeira, imponente em ambas as margens, que só não tinha continuidade em menos de CEM metros junto à PAÇARIA, na margem direita!
À distância de mais de cinquenta anos, recordo com nostalgia toda a beleza daquela Ribeira, que fazia lembrar um enorme " jardim " e que tinha o seu início junto à foz do Arda e em ambas as margens, e, continuava para lá de Aradelo, creio ser este o nome, estamos a falar de grandes distâncias e muitos milhares de hectares!...
Era a ocupação e o sustento de muitas famílias, porque era possível retirar daquelas terras gordas, boa produção. E não era só milho e feijão!...
Convém aqui referir, ainda, que, enquanto a preciosa água ia faltando um pouco por toda a aldeia, à medida que a exploração do carvão avançava, toda a Ribeira não sentia esse problema, porque o ARDA estava ali, mesmo à mão de semear, era só o lavrador coordenar os trabalhos e na hora pôr a NORA em funcionamento... E, se bem me recordo, as noras abundavam, de acordo com o essencial, ao longo de toda a Ribeira.
O casario em Pedorido também sofreu alterações de monta! O Alto do Picão e a Mina da Pedra perderam praticamente todas as casas, devido à exploração mineira, mas em contra-partida, grande parte daquele Monte que fica entre o Douro e o Arda, tem sido palco de novas e melhores construções e quer-nos parecer que Pedorido e Oliveira do Arda estarão já ligadas pelo casario!
Por outro lado, esta nova zona de construção terá melhor acessibilidade que as zonas que foram sendo abandonadas, e, do ponto de vista de salubridade, parece, que, também não há comparação possível.
Apetece-nos dizer, que se confirma, aqui, aquela bela frase do poeta, quando exclama com convicção:

«É fundamental que o Homem sonhe para que as coisas aconteçam»

UM ENORME ABRAÇO PARA PEDORIDO E RIO MAU !

terça-feira, 25 de agosto de 2009

Uma história linda e que dá que pensar!...

Ha´acontecimentos que determinam a matriz de um povo e por vezes torna-se difícil saber o que terá levado esse mesmo povo a ser determinado, teimoso e persistente na procura de algo de que nunca abdica e porque insiste,insiste, lá acaba por conduzir a água até ao moinho!

Vamos directamente à história porque tem um rico conteúdo, tem substância e por via disso merece ser contada, mas aviso já que sempre foi para mim, muito difícil perceber, como tudo terá começado, se é que começou com " alguém "...
-« Estávamos nas décadas de QUARENTA e CINQUENTA e em Rio-Mau como em todas as aldeias, vilas e cidades, o uso de correspondência era grande, e, sempre achei estranho, que tanto as cartas que seguiam para território luso, como para o estrangeiro, no verso do envelope era omitido o nome da freguesia, que, como é sabido, era na época Sebolido. Para efeitos de correspondência e através dos CTT constava sempre CORREIO de ENTRE-OS-RIOS no remetente ao mesmo tempo que Sebolido era omitido, muito embora fosse a freguesia. Devo confessar que nunca pedi explicações sobre o assunto aos meus queridos conterrâneos de Rio-Mau, nem ouvi, nem li qualquer artigo que me viesse elucidar. Apenas arquivei na memória e desde miúdo, um acontecimento colectivo e para mim difícil de entender, dado que na época o regime estava muito atento às " desobediências " e nunca se me constou que houvesse reivindicação num qualquer sentido. Acontece que deixei Rio-Mau com sete anos e daí a minha ignorância quanto ao tema, que gostaria de conhecer melhor...
O que veio a suceder após o inevitável 25 de Abril já é de todos conhecido :- Rio-Mau deixa de ser um lugar de Sebolido e passa a freguesia, só que desconheço como passaram a ser feitos os remetentes das cartas... Será que também aí houve alguma mudança?...
O enigma para mim, e o mais importante, era saber se essa "desobediência colectiva" ( ? ) que já se verificava na minha infância, terá estado na origem, ou não, daquele estado de alma que germina durante décadas e que espera pacientemente para eclodir, qual vulcão, após ter armazenado toda a força interior necessária à ruptura dum colete de forças lá mais para diante e que iria permitir que todo um povo partisse para um outro paradigma mais exigente, mas que iria consagrar um desejo que acalentavam na sua génese!... Os resultados da exigência, se é que de exigência se tratou estão à vista e todos são unânimes em reconhecer que Rio-Mau cresceu muito e tornou-se mais moderno e dá mostras de que não irá parar... Oxalá!

De resto, Sebolido tem também o seu espaço próprio para progredir como se espera, e, sabemos que está a fazê-lo, para bem das suas gentes e do país democrático em que todos estamos enseridos. A verdadeira luta será pelo progresso e pelo bem-estar das populações!
Deu-me particular satisfação relembrar uma história já antiga e que fala do povo a que pertenço!
Sei também que lhe faltarão pormenores que seria importante conhecer, porém, creio que isso também acontecerá com todas as HISTÓRIAS VERDADEIRAS!


UM ABRAÇO DO TAMANHO DA SERRA DA BONECA!

domingo, 23 de agosto de 2009

... Recordar o Arda e a Paçaria...

Tenho muitas e grandes recordações do ARDA! Lidei muito de perto com este afluente do DOURO a partir dos meus oito anos e foi nele que aprendi a nadar e a dar os primeiros mergulhos, ali um pouco a montante da Ponte Centenária, que era também a única ponte no início da década de CINQUENTA! Curiosamente na época o tráfego rodoviário era enorme e nos dois sentidos, porque a Carbonífera escoava por esta ponte todo o carvão das Minas do Fojo até Germunde e se juntarmos todo o tráfego da N222, estamos a considerar um volume de tonelagem que se fosse divulgado, iria causar espanto, mesmo às pessoas do meio...
Apesar de toda a azáfama de então, creio que o estado geral da referida Ponte, que agora é mais conhecida por PONTE VELHA, se comparado com o dos nossos dias, parece-nos que o estado actual é de degradação evidente e por este "deixa andar" a degradação vai acentuar-se...
O nosso povo diz:-« O que está mal, mal parece» e é o caso em questão.
Mas voltemos ao Arda e às suas belas recordações! O curso do rio que conhecíamos bem, ia da foz até uma "levada"onde funcionava um moinho, creio que de sol a sol e que na época abastecia a maioria das famílias com a farinha de milho e centeio e donde depois era fabricado o pão para cerca de uma semana. Nesta grande represa junto ao moinho fizeram uma ponte que ligava as duas margens e que dava ligação de Pedorido e sobretudo da Póvoa à Estação e a Oliveira do Arda...
Frequentava nessa altura a primária e tocou-me muitas vezes a tarefa de levar o milho até ao referido moinho e numa das vezes assisti a uma cena, que achei curiosa, e que vos passo a contar:
- « A distância do lugar onde morava ao dito Moinho andaria aí pelos dois quilómetros através dum caminho de pinhal e que na parte última descia duma forma acentuada até ao Arda. Já com o Arda à vista deparo no caminho e em sentido oposto com o burrito do moleiro que transportava a sua carga habitual de farinha rumo a Pedorido na companhia do jovem moleiro e que dava pelo nome de MARECOS. No mesmo sentido uma senhora de alguma idade e que trajava toda de preto trazia à cabeça um pequeno saco de farinha com cerca de quinze a vinte quilos, não mais!
O jovem moleiro ao passar pela senhora dá ordem ao burro para parar e gentilmente pede o pequeno saco à mulherzinha, coloca-o em cima da carga do animal e de seguida dá ordem ao burrito para prosseguir a marcha. Só que o burro não quis prosseguir a marcha, apesar da insistência do jovem moleiro, que optou, ele próprio, por fazer o transporte do saco da freguesa!
Moral da história:- Apesar de ser um animal recusou firmemente uma carga suplementar e com os meus nove anitos fiquei sem perceber patavina de tal atitude!... Ousou recusar e venceu!
Bastante mais abaixo e ainda no Arda, mas nos anos seguintes, viemos a viver com outros miúdos momentos muito agradáveis, numa zona com águas um pouco profundas e que por isso convidavam a mergulhos, que a maior parte dos rapazes executava com rara habilidade, e, curioso, sem sequer se magoarem. Era o poço da PAÇARIA ao seu mais alto nível e com repetição ano após ano! Todos os rapazes do meu tempo foram muito FELIZES na PAÇARIA!
Agora que o Poço da Paçaria também só existe nas nossas MEMÓRIAS não deixemos morrer essas MEMÓRIAS! E depois faz-nos tão bem reviver o melhor do nosso passado colectivo!...

UM FORTE ABRAÇO! ATÉ BREVE!

sábado, 22 de agosto de 2009

... RECORDAR O POÇO NEGRO!...Recordar a LEVADA!

Aquele pequeno ribeiro não seria pròpriamente um rio, até porque me lembro, teria cerca de cinco, seis anos e percorrer não só as suas margens, como também atravessá-lo a pé em vários locais. Estaríamos, talvez, nos meses do Verão, é possível, até porque havia sinais evidentes mais a montante de alguma ferocidade do dito ribeiro, os estragos eram evidentes no que restava de uma ponte de pedra, com um tamanho razoável na margem esquerda, mas quase inexistente na outra margem e a separar estas ruínas era o vazio e lá no fundo as águas do dito rio Mau, assim chamado, deslizavam numa zona mais central recheada de seixos bastante grados,quase arredondados e que não davam muito jeito para ser pisados, talvez, porque os pèzitos eram naquela tenra idade um suporte frágil, de um corpo que não poderia ter sólido equilíbrio. Os humanos haviam remediado a queda da referida ponte de pedra, com a colocação um pouco mais a jusante de uma improvisada ponte de madeira que garantia a passagem às pessoas e aos animais de pequeno porte, uma vez que os carros de bois e mesmo estes grandes animais faziam a travessia pelo próprio ribeiro nas zonas pré-determinadas e que eram, naturalmente, as zonas mais baixas... A água era límpida, via-se com nitidez que assim era e não havia razões para supôr que assim não fosse, por se tratar dum ribeiro que teria as suas origens numa escarpa montanhosa ali bem próximo e numa das fraldas da "Serra da Boneca"; as pequenas casas junto da ponte semi-destruida eram o início ou o fim do povoado na margem direita e até à nascente, ribeiro acima , não havia sinais da existência de mais seres humanos, excluindo naturalmente o polo da Estivada, local previamente escolhido para a montagem dos abençoados moinhos que movidos de forma engenhosa pela força dum pequeno caudal, transformavam em farinha alqueires e alqueires de milho!... Neste local ermo, solitário, algumas pessoas durante décadas e décadas levaram para diante um trabalho NOTÁVEL para que muitas das famílias de Rio Mau, Melres e Sebolido tivessem acesso a um pão de milho de óptima qualidade e que seria desejável que nunca faltasse na mesa de todas estas criaturas... Aí pelo ano de 1949 ou 1950 na companhia de miúdos mais crescidos tive a felicidade de conhecer um ponto mais ousado do ribeiro, que me fascinou e que ficava já nas fraldas da serra: o tão falado Poço Negro! Tinha a forma natural duma represa e fiquei com a ideia que a água penetrava naquele espaço em queda e duma forma desordenada; recordo muito vagamente de que os miúdos que já sabiam nadar, que não era o meu caso, se iam colocar por baixo do já referido caudal que se despenhava tão desajeitadamente logo no início do referido POÇO! Numa zona quase central salientava-se uma espécie de pequeno rochedo, e era o único, que emergia das águas e servia à miudagem como ponto intermédio de apoio. Desconheço qual a razão do baptismo, mas poderá muito bem ser derivado à côr escura das águas em algumas zonas do POÇO e que eram de tal profundidade, que não se conseguia ver o fundo!... Apesar de tudo se ter passado há cerca de sessenta anos fiquei com a ideia de ser uma zona muito resguardada pela encosta e pelo arvoredo, que não me pareceu muito denso; as águas eram frescas, quase frias e a temperatura do ar ligeiramente inferior à da aldeia, uma vez que ali e por ser Verão, o Sol incidia com toda a sua plenitude sobre a aldeia e o Douro com um caudal bem reduzido e num plano demasiado inferior, muito pouco poderia amenizar... Presumo, que ainda hoje a situação seja bastante próxima à do final da década de QUARENTA do século passado, mas não há essa garantia, a julgar pelos erros que têm sido cometidos pelos humanos um pouco por toda a parte... Esperemos que no caso em concreto não tenha havido nenhuma má influência, para que os miúdos do século XXI possam também usufruir, tal como eu, com alegria e prazer dum espaço natural como era o POÇO NEGRO!...

Foi para mim extraordinário recordar o primeiro momento mais marcante e mais feliz em que tomei parte, pelo acto de profunda liberdade ao contactar com uma natureza sem donos e sem as transformações que quase sempre desvirtuam!... Se aquilo não era o PARAÍSO de que muitos falam, foi com certeza o melhor PARAÍSO que conheci, ou pelo menos, assim quero acreditar!...


Na minha última ida a Rio Mau, em Setembro deste ano, pela conversa que mantive com os meus conterrâneos, pude concluir que vivi equivocado durante sessenta anos, por pensar que tinha conhecido em miúdo o famoso Poço Negro, quando na verdade se tratava da LEVADA! Não importa, o erro já está a ser corrigido e continuo a afirmar a outra grande verdade, essa sim, para mim muito importante, quando com seis ou sete anos visionei com toda a Liberdade um espaço cem por cento natural, num dia quente de Verão e na companhia de outros miúdos e em que fiquei com a sensação de que tudo ali se conjugara para que existisse de facto uma HARMONIA e uma PAZ que durou todo aquele espaço de tempo e vivo com a ideia de que tudo isto só foi possível, porque estaria a começar a descobrir coisas novas e belas, convencido que seria só o começo e que de seguida viriam muitas mais coisas BOAS e BELAS... e sempre MARAVILHOSAS!

O miúdo estava tão enganado!... Acreditava, porque não tinha a memória que agora já tem, que é o que se passa com os demais humanos; aos sete anos nem os GÉNIOS têm MEMÓRIA!

Apesar das muitas vicissitudes e de coisas muito belas que ajudamos a conseguir pela vida fora, reconheço que foi fantástico ter conhecido a LEVADA e usufruido de toda aquela envolvência natural, que deixou em mim a ideia de que a FELICIDADE mora sempre paredes meias com o Homem, só que o sonho muitas vezes lhe escapa!... E é uma pena...

Agora, começo a sentir uma vontade interior enorme de não só revisitar a LEVADA e levar a aventura um pouco mais além, até encontrar o tão badalado POÇO NEGRO!

O SONHO JÁ MORA CÁ...