Era já um hábito aqueles quatro casais se mobilizarem, a eles e aos filhos, em alguns domingos e nos melhores meses do ano, saírem de suas casas pela manhã, com o almoço devidamente acondicionado em cestas de verga, nunca esquecendo as bebidas, partirem a pé com destino a locais ao ar livre e já determinados, optando de preferência pela sombra das árvores, para aí estender as toalhas, e, de seguida saborear, aquela que seria a melhor refeição da semana!
Na época, estávamos no início dos anos CINQUENTA, trabalhava-se de Segunda a Sábado, em toda a Indústria Nacional e apenas se descansava ao Domingo, considerado como um dia "sagrado", quase...
A 2ª Guerra Mundial tinha terminado há pouco mais que meia dúzia de anos, grande parte da Europa tinha sido devastada, e, o nosso País, que ficara fora do conflito, tinha pela frente uma série de problemas, todos resultantes do sub-desenvolvimento em que havia mergulhado há décadas e que o Estado Novo, também não resolvera. Éramos um país pobre, em muitos aspectos, sem infra-estruturas capazes, com pouca indústria e incipiente, com uma taxa de analfabetismo elevada, com uma mortalidade infantil muito perto dos cinquenta por cento... As terras não eram devidamente cultivadas e por via disso, o resultado por hectare era incomparavelmente inferior à dos países que emergiam na Europa. O isolamento político do regime ditatorial completava a desgraça...
Ganhava-se muito mal, os trabalhos disponíveis eram pesados e a emigração era uma tábua de salvação para uma parte da população, só que era uma mão de obra não qualificada, porque essa qualificação neste país era coisa rara... Curiosamente, o regime de partido único não permitia, talvez por desconfiança, a emigração para as ex-colónias, em especial para Angola e Moçambique, e, esse, foi outro erro grave que também custou caro aos portugueses; não é que fosse a solução para os muitos problemas dos portugueses, até porque as ex-colónias sempre estiveram abandonadas à sua sorte, sem uma política de desenvolvimento e por conseguinte se não havia condições para os naturais, muito menos para receber colonos ou emigrantes...
É neste quadro negro que as minas no Pejão laboravam a todo o gás possível, com o fim de tirar das suas entranhas o carvão imprescindível às necessidades, porque a tecnologia em serviço no país , fora concebida para consumir este fóssil. Neste contexto, tinha tido início no pós-guerra, talvez, um dos melhores períodos da Companhia Carbonífera de capital belga. Havia ali muito trabalho, especialmente nas minas e como eram tarefas que exigiam pouca qualificação, o recrutamento era feito nas povoações do Couto Mineiro e nas suas redondezas; o pessoal mais especializado era recrutado noutros pontos do país e a quem era atribuído outras condições e melhores remunerações!
A provar este bom momento da Carbonífera, teve início no ano de 1949 um conjunto de actividades nas áreas da Cultura e do Desporto e que iam desde a música, alguma representação na área do teatro, projecção de cinema em alguns pontos do Couto Mineiro e ainda no futebol, atletismo, ciclismo, ténis e uns anos mais tarde na natação... Foi uma actividade cultural e desportiva sem precedentes naquela zona do Douro, e, será justo lembrar, que, na música, no atletismo e na natação, uma boa percentagem eram mesmo mineiros, ou que de alguma forma executavam tarefas ligadas à produção.
É neste contexto preciso, que os quatro chefes de família atrás referidos no início da história, fazendo parte dos activos da Carbonífera, se encontram regularmente executando tarefas de chefia intermédia de alguma responsabilidade, o que vai permitir que entre eles se estabeleça uma relação de amizade e sobretudo confiança, factor importante naquela época... Convém aqui referir que os portugueses duma maneira geral, cultivavam uma dose elevada de astúcia ou manha, como que a tentar compensar as falhas académicas, que eram naturais e também normais, uma vez que ninguém evolui sem as necessárias condições. Resumindo, eram as vítimas mas não eram os culpados!
Moram os quatro na mesma aldeia e a cerca de três quilómetros de Germunde, ponto fulcral e estratégico da Carbonífera, ali numa colina sobranceira ao Douro e por onde se escoava, através de barcaças construídas para esse fim, todo o carvão retirado das minas do Fôjo e Germunde e que seguiria desta última localidade para os mais variados destinos do território Nacional.
Por estas alturas, nos anos CINQUENTA, o tráfego diário no Douro era intenso... Por um lado era toda a azáfama dos RABELO, no vai-vem entre o vinhateiro Alto Douro e o Porto e Gaia e por outro era o vai-vem constante das Barcaças do Pejão entre Germunde e a Cidade Invicta!
É evidente que três dos quatro casais regulavam pelas mesmas idades e com os filhos sucedia o mesmo e por isso frequentavam a Primária na mesma Escola em Pedorido, que não tinha boas condições e seria um espanto se as tivesse... Se tudo viesse a desenhar-se dentro do que era habitual, dali a uns anos os rapazes iriam engrossar as fileiras da Carbonífera, enquanto as raparigas seguiriam o rumo das suas mães e tornar-se-iam boas donas de casa, assim se esperava, porque nada apontava para que viesse por aí alguma mudança, infelizmente.
Os anos vão passando, os cenários mantêm-se e atingimos o ano de 1953...
Mantinha-se a amizade entre os casais e de vez em quando o almoço domingueiro lá se concretizava, sempre em locais diferentes e um deles chegou a ter lugar em GAÍDO, um pequeno lugarejo do interior e pertencente à mesma freguesia!...
Até que naquele ano de 1953, talvez para fugir à rotina, vai-se lá saber porquê, os nossos personagens resolveram, desta vez, atravessar o Douro de barco para a outra margem, e já em Rio Mau iniciar a pé uma subida enorme e difícil, até atingir o ponto mais elevado da Serra da Boneca, e bem lá no alto, saborear aquele apetecível almoço domingueiro, mas, desta vez, tendo pela frente não só um cenário, mas vários, era só escolher, dependeria do gosto dos que haviam cortado a "meta" e foram todos da comitiva!`
A esta distância, tenho algumas ideias do que presenciei e que ficou em mim gravado:- «Desde logo atingimos com o olhar áreas enormes, muito casario distribuido duma forma desordenada, dentro dum enorme espaço verde e que contrasta naturalmente; uma cadeia de montes em zigue-zague, em que uns sobressaem e dão nas vistas, também pela proximidade como é o caso do monte de S. Domingos, e por último destacava-se lá no fundo o Douro e as suas águas pouco límpidas, mais os seus inseparáveis areais e que fazem um contraste natural com toda a mancha verde do arvoredo diversificado e que o envolve, quase esconde o RIO, ou será que quer sòmente protegê-lo?... Na verdade, não são só os montes que fazem os tais zigue-zagues ou que serpenteiam; o Douro faz precisamente o mesmo e serpenteia desde as longínquas terras de Espanha em caminhada veloz a caminho do litoral e da terra lusitana, aspirando chegar ao mar ATLÂNTICO, afim de completar a principal tarefa de que foi incumbido há milhões de anos e que é de completar todo o seu ciclo. Teremos todos de concordar que o Douro merece de nós, humanos, admiração e respeito, porque sempre fez bem a sua principal missão, a de completar o seu ciclo no Atlântico! Será por tudo isto que há quem afirme que OS RIOS SÃO ETERNOS?!.
Talvez, porque se tratasse duma caminhada mais longa e sobretudo mais difícil que as anteriores, os mentores resolveram desta vez, alargar o convite a mais pessoas e assim seriam TRINTA ou um pouco mais! Uma boa parte eram crianças, e, por via disso, resolveram "atacar" a Boneca da seguinte forma:- Dividiam-se em dois grupos; o grupo das crianças e das mulheres subiria por uma zona que achavam ser mais directa e mais fácil, sempre acompanhados por pessoa amiga de Rio Mau, chamado ORLANDO SOUSA, ainda vivo felizmente e que conhecia não só toda a subida, mas também o ponto de encontro com o segundo grupo; eu próprio, contador da história e que só tinha dez anos, naturalmente, fiz parte do primeiro grupo; o segundo grupo, composto por homens, levava também um guia e que era seguramente de Rio Mau, mas que já não consigo recordar... Este segundo grupo pretendia "atacar" a Serra pela vertente mais difícil, que era seguir parte do percurso mais importante do ribeiro e que dá pelo nome de rio Mau, donde a povoação vai "beber" o nome e acompanhá-lo para montante desde a Levada, passando pelo Poço Negro,pela Estivada, onde pontificavam os moinhos movidos pelas águas deste pequeno afluente do DOURO e que com o seu trabalho intenso, deveriam produzir toda a farinha e o PÃO necessário às três localidades da margem direita: Rio Mau, Sebolido e até Melres! Este segundo grupo, a determinada altura do percurso deixaria de acompanhar o curso do ribeiro e tomaria uma outra rota, com o objectivo de se encontrar com o nosso grupo; o essencial terá corrido dentro do previsto e os grupos lá se encontraram, ali às portas duma pequena localidade chamada CABROELO e a partir dali encetamos uma travessia de sentido ascendente, procurando chegar ao ponto mais elevado da BONECA, onde existe um marco como referência. Não foi nada fácil, esta parte final até à "meta", lá no alto, não só porque todos estariam já bastante cansados, mas porque não existia um caminho, ou mesmo um carreirito, desajeitado que fosse e que suavizaria as dificuldades até ao cume. Resultou, por isso que as crianças sentiram e de que maneira as dificuldades do terreno e houve que recorrer a recursos como gatinhar, trepar obstáculos, contornar por fora algumas elevações de ardósia solta e que criaram muito embaraço...
Finalmente, todos atingiram o cume da Serra e ninguém se magoou a sério da aventura que os adultos a todos arranjaram, com mais razão de queixa para as crianças... Seguiu-se de imediato a escolha do local para estender as toalhas, mesmo que fosse preciso improvisar, colocar os pratos, os talheres e os copos da bebida, sempre fundamental nestas circunstâncias e sem cerimónia e num ambiente de muita alegria, dar início ao melhor almoço, que todos os presentes até àquele domingo haviam saboreado: ALMOÇAR NO PONTO MAIS ALTO DA BONECA!
Tenho uma vaga ideia, porque muitas coisas se perdem da nossa MEMÓRIA, mas neste preciso momento do almoço, nenhum trocou as lindas paisagens pela comida!... Tudo isso ficou para depois, quando a disposição melhorou e houve até direito à fotografia colectiva, lá bem no alto da Serra e que ficará a atestar que não foi um sonho de um qualquer, mas um acontecimento real e que não voltaram a repetir, vai-se lá saber porquê?!...
Passaram já CINQUENTA e SEIS ANOS sobre aquela data! Quem haveria de dizer!...
Os quatro chefes de família que estiveram na origem destes acontecimentos foram desaparecendo e só nos resta a lembrança e muita saudade, e, tudo isso, irá também um dia morrer connosco, inexoravelmente...
Do restante colectivo, só um ou outro terá desaparecido, felizmente a maior parte está aí para recordar, se for o caso e quem sabe, poder ainda voltar à Serra da Boneca e dali usufruir ainda com mais liberdade, com a LIBERDADE que ABRIL veio possibilitar e dar a conhecer, que os HOMENS poderão ser ainda mais IGUAIS nas DIFERENÇAS, que são óbvias e salutares!
Pensemos todos nisso!
UM ABRAÇO DO TAMANHO DA BONECA PARA RIO MAU E PEDORIDO!
Na época, estávamos no início dos anos CINQUENTA, trabalhava-se de Segunda a Sábado, em toda a Indústria Nacional e apenas se descansava ao Domingo, considerado como um dia "sagrado", quase...
A 2ª Guerra Mundial tinha terminado há pouco mais que meia dúzia de anos, grande parte da Europa tinha sido devastada, e, o nosso País, que ficara fora do conflito, tinha pela frente uma série de problemas, todos resultantes do sub-desenvolvimento em que havia mergulhado há décadas e que o Estado Novo, também não resolvera. Éramos um país pobre, em muitos aspectos, sem infra-estruturas capazes, com pouca indústria e incipiente, com uma taxa de analfabetismo elevada, com uma mortalidade infantil muito perto dos cinquenta por cento... As terras não eram devidamente cultivadas e por via disso, o resultado por hectare era incomparavelmente inferior à dos países que emergiam na Europa. O isolamento político do regime ditatorial completava a desgraça...
Ganhava-se muito mal, os trabalhos disponíveis eram pesados e a emigração era uma tábua de salvação para uma parte da população, só que era uma mão de obra não qualificada, porque essa qualificação neste país era coisa rara... Curiosamente, o regime de partido único não permitia, talvez por desconfiança, a emigração para as ex-colónias, em especial para Angola e Moçambique, e, esse, foi outro erro grave que também custou caro aos portugueses; não é que fosse a solução para os muitos problemas dos portugueses, até porque as ex-colónias sempre estiveram abandonadas à sua sorte, sem uma política de desenvolvimento e por conseguinte se não havia condições para os naturais, muito menos para receber colonos ou emigrantes...
É neste quadro negro que as minas no Pejão laboravam a todo o gás possível, com o fim de tirar das suas entranhas o carvão imprescindível às necessidades, porque a tecnologia em serviço no país , fora concebida para consumir este fóssil. Neste contexto, tinha tido início no pós-guerra, talvez, um dos melhores períodos da Companhia Carbonífera de capital belga. Havia ali muito trabalho, especialmente nas minas e como eram tarefas que exigiam pouca qualificação, o recrutamento era feito nas povoações do Couto Mineiro e nas suas redondezas; o pessoal mais especializado era recrutado noutros pontos do país e a quem era atribuído outras condições e melhores remunerações!
A provar este bom momento da Carbonífera, teve início no ano de 1949 um conjunto de actividades nas áreas da Cultura e do Desporto e que iam desde a música, alguma representação na área do teatro, projecção de cinema em alguns pontos do Couto Mineiro e ainda no futebol, atletismo, ciclismo, ténis e uns anos mais tarde na natação... Foi uma actividade cultural e desportiva sem precedentes naquela zona do Douro, e, será justo lembrar, que, na música, no atletismo e na natação, uma boa percentagem eram mesmo mineiros, ou que de alguma forma executavam tarefas ligadas à produção.
É neste contexto preciso, que os quatro chefes de família atrás referidos no início da história, fazendo parte dos activos da Carbonífera, se encontram regularmente executando tarefas de chefia intermédia de alguma responsabilidade, o que vai permitir que entre eles se estabeleça uma relação de amizade e sobretudo confiança, factor importante naquela época... Convém aqui referir que os portugueses duma maneira geral, cultivavam uma dose elevada de astúcia ou manha, como que a tentar compensar as falhas académicas, que eram naturais e também normais, uma vez que ninguém evolui sem as necessárias condições. Resumindo, eram as vítimas mas não eram os culpados!
Moram os quatro na mesma aldeia e a cerca de três quilómetros de Germunde, ponto fulcral e estratégico da Carbonífera, ali numa colina sobranceira ao Douro e por onde se escoava, através de barcaças construídas para esse fim, todo o carvão retirado das minas do Fôjo e Germunde e que seguiria desta última localidade para os mais variados destinos do território Nacional.
Por estas alturas, nos anos CINQUENTA, o tráfego diário no Douro era intenso... Por um lado era toda a azáfama dos RABELO, no vai-vem entre o vinhateiro Alto Douro e o Porto e Gaia e por outro era o vai-vem constante das Barcaças do Pejão entre Germunde e a Cidade Invicta!
É evidente que três dos quatro casais regulavam pelas mesmas idades e com os filhos sucedia o mesmo e por isso frequentavam a Primária na mesma Escola em Pedorido, que não tinha boas condições e seria um espanto se as tivesse... Se tudo viesse a desenhar-se dentro do que era habitual, dali a uns anos os rapazes iriam engrossar as fileiras da Carbonífera, enquanto as raparigas seguiriam o rumo das suas mães e tornar-se-iam boas donas de casa, assim se esperava, porque nada apontava para que viesse por aí alguma mudança, infelizmente.
Os anos vão passando, os cenários mantêm-se e atingimos o ano de 1953...
Mantinha-se a amizade entre os casais e de vez em quando o almoço domingueiro lá se concretizava, sempre em locais diferentes e um deles chegou a ter lugar em GAÍDO, um pequeno lugarejo do interior e pertencente à mesma freguesia!...
Até que naquele ano de 1953, talvez para fugir à rotina, vai-se lá saber porquê, os nossos personagens resolveram, desta vez, atravessar o Douro de barco para a outra margem, e já em Rio Mau iniciar a pé uma subida enorme e difícil, até atingir o ponto mais elevado da Serra da Boneca, e bem lá no alto, saborear aquele apetecível almoço domingueiro, mas, desta vez, tendo pela frente não só um cenário, mas vários, era só escolher, dependeria do gosto dos que haviam cortado a "meta" e foram todos da comitiva!`
A esta distância, tenho algumas ideias do que presenciei e que ficou em mim gravado:- «Desde logo atingimos com o olhar áreas enormes, muito casario distribuido duma forma desordenada, dentro dum enorme espaço verde e que contrasta naturalmente; uma cadeia de montes em zigue-zague, em que uns sobressaem e dão nas vistas, também pela proximidade como é o caso do monte de S. Domingos, e por último destacava-se lá no fundo o Douro e as suas águas pouco límpidas, mais os seus inseparáveis areais e que fazem um contraste natural com toda a mancha verde do arvoredo diversificado e que o envolve, quase esconde o RIO, ou será que quer sòmente protegê-lo?... Na verdade, não são só os montes que fazem os tais zigue-zagues ou que serpenteiam; o Douro faz precisamente o mesmo e serpenteia desde as longínquas terras de Espanha em caminhada veloz a caminho do litoral e da terra lusitana, aspirando chegar ao mar ATLÂNTICO, afim de completar a principal tarefa de que foi incumbido há milhões de anos e que é de completar todo o seu ciclo. Teremos todos de concordar que o Douro merece de nós, humanos, admiração e respeito, porque sempre fez bem a sua principal missão, a de completar o seu ciclo no Atlântico! Será por tudo isto que há quem afirme que OS RIOS SÃO ETERNOS?!.
Talvez, porque se tratasse duma caminhada mais longa e sobretudo mais difícil que as anteriores, os mentores resolveram desta vez, alargar o convite a mais pessoas e assim seriam TRINTA ou um pouco mais! Uma boa parte eram crianças, e, por via disso, resolveram "atacar" a Boneca da seguinte forma:- Dividiam-se em dois grupos; o grupo das crianças e das mulheres subiria por uma zona que achavam ser mais directa e mais fácil, sempre acompanhados por pessoa amiga de Rio Mau, chamado ORLANDO SOUSA, ainda vivo felizmente e que conhecia não só toda a subida, mas também o ponto de encontro com o segundo grupo; eu próprio, contador da história e que só tinha dez anos, naturalmente, fiz parte do primeiro grupo; o segundo grupo, composto por homens, levava também um guia e que era seguramente de Rio Mau, mas que já não consigo recordar... Este segundo grupo pretendia "atacar" a Serra pela vertente mais difícil, que era seguir parte do percurso mais importante do ribeiro e que dá pelo nome de rio Mau, donde a povoação vai "beber" o nome e acompanhá-lo para montante desde a Levada, passando pelo Poço Negro,pela Estivada, onde pontificavam os moinhos movidos pelas águas deste pequeno afluente do DOURO e que com o seu trabalho intenso, deveriam produzir toda a farinha e o PÃO necessário às três localidades da margem direita: Rio Mau, Sebolido e até Melres! Este segundo grupo, a determinada altura do percurso deixaria de acompanhar o curso do ribeiro e tomaria uma outra rota, com o objectivo de se encontrar com o nosso grupo; o essencial terá corrido dentro do previsto e os grupos lá se encontraram, ali às portas duma pequena localidade chamada CABROELO e a partir dali encetamos uma travessia de sentido ascendente, procurando chegar ao ponto mais elevado da BONECA, onde existe um marco como referência. Não foi nada fácil, esta parte final até à "meta", lá no alto, não só porque todos estariam já bastante cansados, mas porque não existia um caminho, ou mesmo um carreirito, desajeitado que fosse e que suavizaria as dificuldades até ao cume. Resultou, por isso que as crianças sentiram e de que maneira as dificuldades do terreno e houve que recorrer a recursos como gatinhar, trepar obstáculos, contornar por fora algumas elevações de ardósia solta e que criaram muito embaraço...
Finalmente, todos atingiram o cume da Serra e ninguém se magoou a sério da aventura que os adultos a todos arranjaram, com mais razão de queixa para as crianças... Seguiu-se de imediato a escolha do local para estender as toalhas, mesmo que fosse preciso improvisar, colocar os pratos, os talheres e os copos da bebida, sempre fundamental nestas circunstâncias e sem cerimónia e num ambiente de muita alegria, dar início ao melhor almoço, que todos os presentes até àquele domingo haviam saboreado: ALMOÇAR NO PONTO MAIS ALTO DA BONECA!
Tenho uma vaga ideia, porque muitas coisas se perdem da nossa MEMÓRIA, mas neste preciso momento do almoço, nenhum trocou as lindas paisagens pela comida!... Tudo isso ficou para depois, quando a disposição melhorou e houve até direito à fotografia colectiva, lá bem no alto da Serra e que ficará a atestar que não foi um sonho de um qualquer, mas um acontecimento real e que não voltaram a repetir, vai-se lá saber porquê?!...
Passaram já CINQUENTA e SEIS ANOS sobre aquela data! Quem haveria de dizer!...
Os quatro chefes de família que estiveram na origem destes acontecimentos foram desaparecendo e só nos resta a lembrança e muita saudade, e, tudo isso, irá também um dia morrer connosco, inexoravelmente...
Do restante colectivo, só um ou outro terá desaparecido, felizmente a maior parte está aí para recordar, se for o caso e quem sabe, poder ainda voltar à Serra da Boneca e dali usufruir ainda com mais liberdade, com a LIBERDADE que ABRIL veio possibilitar e dar a conhecer, que os HOMENS poderão ser ainda mais IGUAIS nas DIFERENÇAS, que são óbvias e salutares!
Pensemos todos nisso!
UM ABRAÇO DO TAMANHO DA BONECA PARA RIO MAU E PEDORIDO!
Acompanho o blogue desde o inicio e gosto do seu conteúdo, destas histórias e outros tempos mas que são deste tempo, quanto mais não seja, porque as pessoas ainda as trazem consigo.
ResponderEliminarParabéns e continua. Gostava de ouvir/ler histórias recentes, deste mesmo tempo.
Abraço do tamanho do MUNDO.
Olá
ResponderEliminarNem sei bem como mas encontrei hoje este espaço e não parei de o ler do início ao fim.
Sou de Rio-Mau e também vivo em Ovar, vai já para 30 anos :)
Fico aqui a perguntar-me: quem é o Piko?
Eu sou o Celso...
Hoje estive em Gondomar (S. Cosme) e encontrei-me com o Valdemar, meu pai, mas também com o Valdemar Stalin. Também lá estavam o António Monteiro, o Piasca, o Peixinho e outros da tua geração (claro que sei quem és!)
ResponderEliminarO motivo da minha ida a S.Cosme não foi nada bom: fui ao funeral do meu tio e vosso companheiro, o Manel Oliveira (Manel fajardo)... Mas mesmo na tristeza da despedida de um tio e um amigo, deu para falar de ti e dos sentimentos que aqui tão maravilhosamente descreves.
Um abraço, amigo!
Caro amigo. Parece que valeu a pena ter regressado à origem naquela viagem em que nos encontramos. É com gosto que repara nas suas narrativas, vivências de um passado não muito distante que convêm relatar. Ainda bem que dedica o seu tempo a esta tarefa solitária mas suficientemente nobre para merecer o aplauso de todos.
ResponderEliminarUm abraço e força na continuação do projecto.
Manuel Araújo da Cunha