terça-feira, 23 de março de 2010

Porque será que isto acontece aos HUMILDES?!

Já andávamos, há umas boas duas décadas para passar para o papel algumas considerações, que se prendem com a forma como a política vem sendo exercida no nosso país, desde que começou a ser possível a ida às urnas para eleger para um determinado período de tempo as pessoas ou os partidos políticos, mas também procurar "ver" ou "entender", como é que as pessoas votam, como votam ou, porque, simplesmente, se recusam a ir votar...Achamos por bem recorrer a dois "bons" exemplos, que se passaram nas autárquicas de 2009 e que põem a descoberto situações, que, no mínimo, encaixam mal num sistema, no essencial livre, mas que põe a nu as fragilidades e vulnerabilidades de uma sociedade que não saberá ponderar, se recusa a ponderar e resolve "alinhar", diria, quase cegamente, ao usar livremente o voto, mas sem exigência pela ética política e no maior dos desprezos por princípios de seriedade e de respeito por todos e em especial pelos humildes!

Estamos a referir-nos a Ovar e a Oeiras que são o paradigma da irracionalidade do voto, embora por questões diferentes, é justo que se diga.
Em Oeiras, estava em causa a eleição de um autarca a contas com a justiça, que, aliás, já se tinha pronunciado com uma pena de sete anos de cadeia efectiva e de cinco anos com perda do direito cívico... Apesar de todo este imbróglio, a maioria dos que foram às urnas naquele mês de 2009, optaram em consciência, por votar no autarca "condenado" pelo tribunal de que não restam dúvidas, terá funcionado como devem funcionar os tribunais num estado de direito!
Este caso é no mínimo polémico e levanta muitas questões, no campo jurídico e até constitucional, mas, parece-nos, que o caso mais sério, prende-se com os que quiseram nas urnas utilizar o voto sem o mínimo de exigência ética, com abandono total de princípios e alheando-se completamente das decisões de um juiz e de um tribunal, que ninguém vai acreditar que andou a inventar provas!...
Nos tempos que correm, onde a informação é abundante, não seria com essa desculpa que poderíamos ficar satisfeitos, quando até estamos informados que Oeiras será um dos concelhos do país com os mais elevados índices de letracia... Ou seja, uma boa percentagem daqueles eleitores terá escolaridade quante baste e essa realidade "incomoda" ainda mais, porque, felizmente, não estamos a tentar analisar o procedimento de pessoas de fracos conhecimentos académicos, quase analfabetos...
Em Ovar, um dos grandes pontos de discórdia, prendia-se com a tentativa do anterior executivo pretender mudar a distribuição da água aos munícipes para um novo contrato, que, no mínimo, iria durar cinquenta anos, que segundo estudos divulgados e nunca desmentidos preto no branco, levaria o preço do m3 para valores mais altos e logo nos primeiros três anos. O caso gerou muita discussão pública, durante a campanha eleitoral, tendo o candidato do BE, que havia rompido com o anterior executivo por via do mesmo assunto, utilizado grande parte da campanha a rebater o que considerava um erro histórico, não só pelos custos futuros da água, mas ainda pelo tempo a que os munícipes iriam ficar amarrados de pés e mãos; apesar de todos estes considerandos, a maioria que foi até às urnas, deu a maioria dos votos ao autor da proposta, que se recandidatara pelo seu partido e nem sequer atribuiu ao candidato do BE o número de votos suficientes para ser eleito como vereador!...Este é outro dos casos, em que mais uma vez, o voto terá sido usado de forma quase irracional, por uma maioria que acha muito bem que a água, um bem essencial para a vida de toda a gente, possa subir para preços mais elevados, logo nos três primeiros anos e que o contrato vá valer cinquenta anos, ou seja, um contrato já a contar com os netos que irão ser a continuidade... Acreditam estes "avós", que até tinham boas razões para duvidar, que os seus queridos netos, daqui a cinco décadas serão todos no mínimo da classe média alta, quando pelo que se vê, infelizmente, as coisas não apontam para sonhos tão altos!...
Um querido amigo meu, contava-me há dias da sua experiência, rica de conteúdos, vivida após a revolução dos cravos até ao início dos anos oitenta, numa empresa da região. No fundamental, cuidou-se de repôr a dignidade no trabalho, onde passou a haver melhores salários e outros direitos que os mais humildes não tinham, apesar da boa condição financeira da empresa! O 25 de Abril veio dar a possibilidade de uma viragem histórica naquela empresa, onde além dos lucros passou a haver DIREITOS e DEVERES para todos e só a partir dali os humildes puderam perceber, que é possível ter além do TRABALHO outros DIREITOS, sem pôr em causa nada, nem ninguém...Só que o "urso" tinha entrado em hibernação e com o colapso de Abril, depois do 25 de Nov. de 75, começa por sair lentamente desse estado e nesse ano de 1978, mobilizou-se e mobilizou alguns apoios internos e externos, para repôr a "ordem" numa situação que aceitara, mas que nunca aceitara, apesar dos excelentes resultados financeiros que todos os anos ia obtendo. Contou o meu amigo que o plano passou por duas fases distintas:

a) Começou por querer retirar alguns dos direitos aos trabalhadores que haviam sido acordados por ambas as partes no final de 74 e querendo que a C. dos Trabalhadores concordasse com o processo, coisa que a C. T. não fez!b) Avançar de seguida para um processo mais radical e eficaz, procurando que fossem os próprios trabalhadores num plenário a destituir a C.T., com o argumento de que só ainda não tinham pago a participação nos lucros, ( fazia parte do acordo interno ) por culpa da C.T.

Já no final do Plenário, alguns desses mobilizados avançaram com a proposta que tinha dois pontos: Propôr à C.T. que se demitisse e caso não o fizesse seria demitida pela Assembleia. É evidente que nenhum dos cinco se demitiu, e, explicaram, que se tratava de manobra do patronato, mas mesmo avisados, a maioria expulsou as cinco pessoas honestas da C.T.

O meu bom amigo, ainda se manteve nessa empresa até 1981, ano em que bateu com a porta, mas até lá, ainda assistiu a uma série de tropelias do patronato para com os trabalhadores mais humildes e como não podia deixar de ser, contra aqueles que foram sempre fiéis aos princípios dos acordos e que o patronato "rasgara" em pedaços, logo que começou a ter condições. Já em 1980, este mesmo patronato teve o descaramento de nas horas de trabalho chamar ao seu gabinete este nosso amigo e ao mesmo tempo que lhe lembrava ser um bom profissional, mas que já estaria a ganhar menos que os porteiros e só lhe dava duas alternativas:- a) Dentro das suas empresas não podia permitir que houvesse alguém a defender os trabalhadores e logo que o deixasse de fazer, teria um bom lugar como contra-partida; b) Caso não aceitasse a sua proposta, iria ter uma grande surpresa, sem chegar a concretizar a ameaça...

Nunca mais houve contactos e passado algum tempo o meu amigo despedia-se do seu chefe directo, dos trabalhadores e da empresa e hoje, passados trinta anos, está seguro que honrou o compromisso que assumira ao assinar o Acordo em fins de 1974 e por isso sente-se tranquilo, só sente uma angústia por se ter apercebido na época, que o tempo dos humildes havia regressado, e, isso doeu, e, ainda hoje, sente alguma saudade, quando recorda que os donos dessa empresa, apelidavam de REVOLUCIONÁRIOS os poucos trabalhadores que nunca vergaram!...

Será que esta história verídica e que em traços gerais o meu bom amigo, já na reforma, me contou, explicará em parte os caminhos curtos e aparentemente aveludados, que cativam os portugueses até às mesas de voto e que não passarão de belas encenações com direito a cumprimentos e a sorrisos, não farão parte, em alguns casos, de um aliciamento que nos poderá conduzir para caminhos longos e pedregosos e com consequências difíceis de avaliar?!...

Não valeria a pena reflectir, pelo menos reflectir?!... Os factos estão aí...

1 comentário:

  1. O grande problema deste país continua a estar que aqueles que elegem os Governantes não são os que lêm os Jornais, mas sim os que limpam o cú a eles.
    Uma outra parte; são aqueles que esses mesmos lhe tratam de tudo e lhes enviam um xeque ao fim de mês sem que nada ou muito pouco o justifique.
    Depois ainda: Os Pais, Filhos, Netos e Bisnetos dos que nos desgovernam.
    Sobram meia dúzia de votos proporcionalmente para aqueles que apesar de saberem que defender causas e não casos se torna cada vez mais difícil.
    Não havendo compensação materialista, é um valor que não tem preço e, serão estes tantos que seguramente deixam sementes para que num futuro próximo o mundo seja melhor e mais justo.
    No testemunho do Amigo da C/Trabalhadores as razões são as mesmas.
    Na maioria dos casos basta que lhes acene com um isco.
    Isto deve-se à dignidade ou falta dela.
    Há valores que tem valor incalculável que nenhum valor monetária pode comprar.
    Parabéns por este excelente testemunho que muito contribuirá para um futuro mais prospero.
    A Juventude é uma Doênça que se cura em pouco tempo. Temos uma Juventude que saberá tirar ilações e vão saber no futuro, não poderão pactuar com situações como as actuais.
    Pede-se continuação e muita força.

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