domingo, 18 de outubro de 2009

O HOMEM mais as suas DÚVIDAS eternas !...

Há verdadeiras histórias, que quando éramos miúdos ou mesmo adolescentes, os professores , os pais ou alguém melhor posicionado na sociedade nos deveria ter contado. Isso não foi feito, as razões foram várias e agora sem recorrer a lamentações, que nada resolvem e só nos desfavorece, ainda vamos a tempo de sem pressas procurar perceber uma pequena parte do muito que haveria para ser contado.... e percebido!

Vamos desta vez procurar entender um pouco melhor o que se terá passado nas nossas "barbas":
- É um pouco estranho para o comum dos mortais, que um dia já distante do século VINTE, possivelmente, um pouco antes da 2ª Grande Guerra e seguramente depois da 1ª Guerra Mundial, que um indivíduo, oriundo do centro da Europa, venha até Portugal, adquira uma vasta zona de exclusividade para a exploração de carvão a quem foi atribuido o título:- ECD (Empresa Carbonífera do Douro L.da). Esse homem chamava-se JEAN TYSSEN e tinha a nacionalidade belga, tanto quanto se sabe, mas desconhecemos completamente de qual zona da Bélgica se tratava, uma vez que é um pequeno país, mas com três zonas e três lìnguas bem diferentes:- francês, flamengo e alemão. Em princípio, a sua naturalidade seria numa destas três zonas, mas o mais importante era conhecer o incidente ou incidentes que teriam estado na origem da sua vinda até ao nosso país, porque também é sabido que explorações mineiras na Bélgica e deste país até Portugal eram aos milhares e isso é que espanta!...
Seja como for, o nosso homem de negócios chegou até esta zona do Douro e chegou a ser por algum tempo a figura grada da Administração, muito embora nos parecesse não ser muito presente, talvez, porque a estrutura que veio a criar lhe desse essa permissa, uma vez que terá delegado no filho, esse sim mais presente, a residir algures no Estoril e que duma forma regular aparecia nas minas do Pejão.
Jean Tyssen apareceu muitas vezes em público na década de CINQUENTA, mas foram raras as vezes em que usou o discurso, talvez porque fosse avesso a esse tipo de comunicação ou por outras razões que desconhecemos e que para o caso também pouco importam... Mas a construção do Hospital em Oliveira do Arda, para todas as famílias do Couto Mineiro, foi um estrondoso sucesso e que deu muita FAMA à Carbonífera e todos nos recordamos da festa grandiosa levada a cabo aquando da sua inauguração! Não era caso para menos!...
Penso que não vou errar, ao divulgar que foi precisamente no calor desta festa, que Jean Tyssen usou da palavra e que os altifalantes espalharam por todo o exterior do novo Hospital e fazendo eco por aquelas colinas adjacentes ao Douro e ao Arda... A dada altura do discurso, o nosso homem num português com sotaque "estrangeirado", faz a seguinte afirmação:

-« Quando "MORER" quero vir para junto "DE" meus "MINEIRAS"»

Entretanto, os tempos iam passando, muita água o Douro e o Arda sem cessar permitiam que corresse para o Atlântico, como era seu compromisso e que sempre respeitaram, enquanto a labuta também continuava no interior e fora das minas! Naturalmente, que o pessoal das minas também trocava impressões e lembro-me perfeitamente de ouvir comentários convictos de que não acreditavam minimamente na afirmação do homem MAIOR e de certa forma LONGÍNQUO, quando dizia que quereria mais tarde "morar" com os mineiros... Não passava de retórica - diziam - e este convencimento até se compreendia, porque na época, os beirões, regra geral, eram fechados sobre si próprios e por via disso desenvolveram certo tipo de defesas, que, acreditavam, os ajudaria a viver ou a sobreviver melhor. De facto, era complicado num cenário tão real como aquele que se vivia em Portugal nos meados de Cinquenta, acreditar em afirmações dum senhor que mal conheciam, dono principal dum empório e naturalmente dono duma grande fortuna, convenhamos.
A história poderia ficar por aqui, mas não vai ficar, porque há novos elementos, que, felizmente consegui recolher, e, que, esses sim, completam parte das interrogações e das dúvidas aqui já contadas. Tomem atenção:
- No dia 17-10-2009, entrei despreocupado e sòzinho no cemitério de Oliveira do Arda e dirigi-me a uma senhora, que, muito concentrada, tratava de arranjar a sepultura de alguém muito querido, perguntando-lhe se não existiria naquele cemitério alguma sepultura com os restos mortais de algum membro da família Tyssen; a senhora foi muito amável e levou-me junto duma simples sepultura toda ela em granito, sem fotografia alguma e com os dizeres seguintes:

JEAN TYSSEN 27.03.1895 HOMEM BOM, AMIGO DOS
22.10.1965 SEUS OPERÁRIOS, JUNTO
DOS QUAIS DESEJOU
SER SEPULTADO.

HOMENAGEM DOS MINEIROS.

Faltará apenas acrescentar uma pequena inconfidência que a gentil senhora me deu a conhecer e que por amor à verdade não vou esconder. Disse-me a senhora:
-« Esta taça ( referindo-se à única taça que solta havia sido colocada sobre a pedra granítica) é enfeitada pelas várias senhoras, que regularmente vêm ao cemitério e que vão renovando as flores de acordo e a gosto de quem se prontifica a fazê-lo». É no mínimo um gesto BONITO!
P. S. Se repararmos nas datas, podemos concluir que no próximo dia 22 de Out. ( quinta-feira ) serão passados 44 anos sobre a data da morte do homem que em vida se chamou Jean Tyssen.
A concluir só resta acrescentar que o homem PROMETERA no seu discurso e outros mais tarde RESPEITARAM!... Agora jaz num dos cemitérios onde também repousam os corpos de muitos mineiros!

quarta-feira, 14 de outubro de 2009

PEDORIDO, a cultura e o desporto nas décadas de cinq. e sessenta!

A década de Cinquenta foi uma época de excepcional qualidade que Pedorido conheceu nas áreas cultural e desportiva. É justo assinalar o enorme êxito que foi a criação da Banda dos Mineiros em 1949 e o futebol, o atletismo e outros desportos como a natação que tinham uma actividade intensa e que eram praticados nas horas de lazer por uma quantidade razoável de profissionais da Carbonífera. Todos sabemos que todas estas actividades só foram possíveis devido à boa condição financeira da Companhia Belga e esta freguesia do Couto Mineiro era o centro nevrálgico, e, devido a esse factor, terá beneficiado à partida de toda uma exposição que outras freguesias não tinham. Assim os dois pequenos estádios que a Carbonífera mandou construir, a Casa da Música e a piscina foram deliberações que recairam sempre em Pedorido, porque também era óbvio, que do ponto de vista prático e económico, não poderia ser de outra forma, ou seja, a haver uma dispersão por mais freguesias tudo sairia muito mais caro e os resultados práticos com essa dispersão seriam sempre inferiores.

Apenas nos lembramos de duas importantes construções que não "nasceram" naquela freguesia; estamos a referir-nos à Cooperativa e ao Hospital que ficaram sediados em Oliveira do Arda, mas se repararmos melhor, verificamos que mesmo assim, a fixação foi ali, logo após o limite de Pedorido!... E se repararmos bem, vamos ainda encontrar uma outra explicação para a localização do Hospital naquele local e que fará todo o sentido e se prende com o facto de ficar mais ou menos a meio caminho entre a mina do Fôjo e a mina de Germunde. Parece-nos que esta localização fazia todo o sentido!
Se tivéssemos que catalogar por uma ordem todas as actividades aqui descritas, parece-nos que a Banda terá sido aquela cujo desempenho mais proveitos trouxe a todo o Couto Mineiro não só nas décadas de Cinquenta e Sessenta, mas ainda porque deu uma boa formação na área da música a muitos jovens e que lhes possibilitou fazer uma carreira profissional futura noutros pontos do País. A Banda do Pejão foi como que um viveiro na área da música e a fama e o proveito correu o nosso Portugal de lés a lés. Seria irrelevante tentar saber quanto se gastou para se pôr de pé uma Banda como a do Pejão, e, tendo em conta que atingiu um nível tão elevado, só por si os custos teriam sido largamente compensados pelos resultados obtidos! Nós não sabemos quem foi o mentor ou mentores que levaram a ideia até à família Tyssen que era quem em última instância aprovava ou desaprovava este tipo de projecto, mas tenho dúvidas que quem idealizou, soubesse de antemão do enorme êxito que lhe estava reservado para muito breve!... A pessoa, se é que foi alguém, merecia uma simples mas sincera homenagem!
As demais actividades culturais e desportivas também tiveram justificação, porque nem só do trabalho vive o Homem e no Atletismo cem por cento amador, houve mineiros que atingiram marcas que para o nosso país eram de considerar e especialmente no Norte rivalizava-se com o F.C. Porto. Era obra!...

Bem, no futebol também se gastou muitos dinheiros, mas não se atingiu o que seria possível e desejável, ou seja, a Música e até o Atletismo atingiram um outro patamar, basta comparar os resultados... Parece-nos que no futebol outros interesses se conjugaram e a partir daí os valores que iam despontando nas freguesias do Couto Mineiro não foram devidamente aproveitados e fica-nos pelo menos a ideia de que teria sido mais benéfico ter optado por equipas das nossas aldeias e apenas recorrer a dois ou três elementos do exterior que em minoria teriam que mostrar com trabalho o que valiam. Ora nunca foi esta a política seguida para o futebol no Pejão e todos nos lembramos que apenas dois ou três eram aproveitados para a equipa principal e a maioria vinha de outras paragens, com os resultados conhecidos. Resumindo, diríamos que apesar dos erros que se cometeram o balanço foi francamente positivo e temos de ter em atenção, convém não esquecer, que a Carbonífera era uma empresa privada, e, nestas coisas podia seguir o rumo que muito bem entendesse e como entendesse...

Vamos ficar por aqui com estas belas recordações e que não passam disso mesmo!...
Pedorido já teve uma grande projecção na cultura e até no desporto, precisamente há CINQUENTA anos!
No FUTURO vai-se lá saber?!...

sábado, 10 de outubro de 2009

HISTÓRIAS CURTAS: Valores e Ética!

A todo o instante estamos todos a fazer a História da Humanidade e os exemplos são de todo o tipo: são excelentes, são bons, são assim-assim, são maus, são péssimos... Durante muitos milhares de anos os humanos, ainda pouco inteligentes, lutavam apenas pela sobrevivência, imitando e até aprendendo com o resto do mundo animal. Foi uma aprendizagem longa mas muito proveitosa, cuja característica assentava numa prática nómada, sempre acompanhada de uma evolução cerebral muito lenta; a esta "travessia do deserto" de muitos milhares de anos,convencionou chamar-se de PRÉ-HISTÓRIA e os muitos estudos que têm sido feitos e que continuam a fazer-se, apontam claramente para uma conclusão: os humanos não evoluiram da mesma forma nas diferentes latitudes, e, isto é tão verdade, que já em pleno século XXI deu-se conta da existência de tribos, algures na floresta do PERÚ e que o mundo civilizado desconhecia em absoluto e com quem nunca houvera qualquer contacto...
Seguramente que estas tribos vivem organizadas, mas com um diferencial de MILHARES de anos para com boa parte dos povos do resto do planeta, que se auto-intitulam de civilizados e que seguramente adquiriram padrões de bem-estar, inimagináveis há bem poucos anos!
Como todos sabemos não há sociedades perfeitas e por conseguinte também não seria nestas sociedades primitivas do Perú ou da Amazónia que iríamos encontrar a tão desejada perfeição, muito embora não tenhamos dados que possam fazer com que afirmemos que serão povos infelizes, porque pode não ser o caso!... Estes estados de felicidade ou infelicidade não têm só a ver com os bens materiais, porque bem perto e dentro da nossa comunidade, é bem possível deparar com pessoas e até famílias que respiram saúde física e mental, que são a condição essencial para o tal equilíbrio que transmite felicidade, sem contudo terem vivido alguma vez para além dos conhecidos limites mínimos no que à riqueza diz respeito!
Em contra-partida uma grande parcela da comunidade vive a sonhar com uma felicidade que sempre lhe escapou e que também não saberá muito bem o que será, esperando com alguma esperança que se não for em vida, então que aconteça para lá desta existência, de que não guarda as melhores memórias, apesar de muita gente desta desfrutar ou ter desfrutado, por vezes, de condições de abastança, que alternaram com ciclos menos bons, diríamos até de necessidades básicas, com toda a família a "beber" a sua formação numa ausência de ética e de valores, que, esses sim, seriam os melhores alicerces para sobre eles poderem aspirar a uma vida de Felicidade CONSEGUIDA, que de outra forma lhes vai fugir, do mesmo modo que a enguia foge por entre os dedos dos humanos na eterna luta pela sobrevivência... e que para o conseguir sabe que só voltando ao Rio...

Os humanos devem ser avisados de que não vão chegar nunca ao estádio de felicidade terrena a que levianamente se propõem, se continuarem a persistir no ERRO em colocar de lado desde muito novinhos e em grande medida por culpa dos "educadores", os referenciados valores éticos, esses sim, tornam os homens e as mulheres VERDADEIRAMENTE GRANDES, e independente de serem ricos ou pobres, ministros ou operários, doutores ou desempregados, autarcas ou pescadores.Tudo o resto são títulos ocasionais e que se forem exercidos sem ética "ajudarão" as sociedades a caminhar para terrenos pantanosos, onde já nem as máquinas sofisticadas têm capacidade para executar "milagres" que tanto jeito davam!
Será sempre tempo de arrepiar caminho, mas os vícios e as vaidades humanas traem, depois de terem feito passar-se pelos melhores amigos do Homem, quando este devia saber que o melhor amigo do Homem, desde a Pré-História, foi e ainda é, aquele nobre animal chamado cão, amigo inseparável das estepes de há muitos milhares de anos e que ainda continua na sua luta pela sobrevivência sem deixar de ser leal e verdadeiro AMIGO!

Voltando ao mundo dos humanos, gostaria de vos dar a conhecer uma pequena passagem da minha vida, uma História Mínima como costumo chamar-lhe, uma pequena faceta, mas que viria a ter um GRANDE significado. Tomem nota:
- Estávamos no ano de 1955 e a minha excelente professora TERESA, natural de Pedorido, um belo dia resolveu falar comigo para me propôr uma espécie de "contrato". Disse-me a professora:- «Vais fazer a 4ª classe e é uma pena ficares parado! És muito novinho para o mundo do trabalho e por isso vou falar com os teus pais para que continuem a apostar em ti nos estudos. Se os teus pais não decidirem por esse lado, e se tu aceitares, vou propôr-lhes que no próximo ano lectivo continues a ajudar-me, porque vou cá continuar com uma outra turma da 4ª classe e vou ter muito trabalho. Se aceitares e como contra-partida da tua colaboração, no final do próximo ano, levar-te-ei à cidade do PORTO, ao Liceu Carolina Michaelis para aí fazeres o Exame de Admissão aos Liceus e os teus pais não têm que pagar rigorosamente nada».
Concordei com o que me fora proposto pela minha professora da 3ª e 4ª classe, porque acreditava que era uma profissional a sério e que melhor que eu próprio, sabia das minhas possibilidades e eu só tinha que ir em frente.
Claro que os meus pais concordaram com a segunda metade da proposta e durante aquele ano lá desempenhei, penso que bem, com a nobre missão de assistente da professora e no final desse ano lectivo na Cidade Invicta até dispensei da prova oral, o que prova que tudo fora bem pensado pela saudosa prof. TERESA!
O mais importante a reter de toda esta história é que com ONZE e DOZE anos lidei a sério com valores e ética que sempre me acompanharam e muito me ajudaram pela vida fora!...
Desde logo a questão da seriedade dos mais velhos para com as crianças; o prometer e cumprir, o valor da palavra dada pela professora ao jovem aluno, valor fundamental no dia a dia das sociedades e que se tem vindo a degradar, de cima para baixo e de baixo para cima; o esforço para a COMPETÊNCIA, o agarrar com PAIXÃO naquilo que pretendemos fazer bem, foi outro atributo que adquiri naquele longínquo ano de 1955 e que não viria mais a largar; o perceber que estava a ser observado por uma pessoa com qualificação e que acreditava no meu desempenho, deu-me responsabilidade e um grande entusiasmo, porque não podia falhar e vir a ter o sucesso que a competente professora de antemão nunca tinha posto em dúvida.
Estes factos são reais e devem ser divulgados para contrapôr às tais práticas sem sentido e que são o pão nosso de cada dia nos tempos actuais...
Não é difícil imaginar que os resultados ainda seriam melhores nesse outro Tempo, se o regime político em exercício, manifestasse outro interesse pela evolução das camadas populares, em vez de as mergulhar conscientemente no OBSCURANTISMO! Isso foi lamentável, mas como a mágoa nada resolve e só atrapalha, temos um largo futuro para com seriedade modificar para melhor o que herdamos de mal e nunca esquecer que mesmo em regimes de pouca credibilidade, é possível viver com ÉTICA para poder ser considerado Homem!

segunda-feira, 5 de outubro de 2009

Visita e Almoço no Alto da Serra da Boneca!...

Era já um hábito aqueles quatro casais se mobilizarem, a eles e aos filhos, em alguns domingos e nos melhores meses do ano, saírem de suas casas pela manhã, com o almoço devidamente acondicionado em cestas de verga, nunca esquecendo as bebidas, partirem a pé com destino a locais ao ar livre e já determinados, optando de preferência pela sombra das árvores, para aí estender as toalhas, e, de seguida saborear, aquela que seria a melhor refeição da semana!
Na época, estávamos no início dos anos CINQUENTA, trabalhava-se de Segunda a Sábado, em toda a Indústria Nacional e apenas se descansava ao Domingo, considerado como um dia "sagrado", quase...
A 2ª Guerra Mundial tinha terminado há pouco mais que meia dúzia de anos, grande parte da Europa tinha sido devastada, e, o nosso País, que ficara fora do conflito, tinha pela frente uma série de problemas, todos resultantes do sub-desenvolvimento em que havia mergulhado há décadas e que o Estado Novo, também não resolvera. Éramos um país pobre, em muitos aspectos, sem infra-estruturas capazes, com pouca indústria e incipiente, com uma taxa de analfabetismo elevada, com uma mortalidade infantil muito perto dos cinquenta por cento... As terras não eram devidamente cultivadas e por via disso, o resultado por hectare era incomparavelmente inferior à dos países que emergiam na Europa. O isolamento político do regime ditatorial completava a desgraça...
Ganhava-se muito mal, os trabalhos disponíveis eram pesados e a emigração era uma tábua de salvação para uma parte da população, só que era uma mão de obra não qualificada, porque essa qualificação neste país era coisa rara... Curiosamente, o regime de partido único não permitia, talvez por desconfiança, a emigração para as ex-colónias, em especial para Angola e Moçambique, e, esse, foi outro erro grave que também custou caro aos portugueses; não é que fosse a solução para os muitos problemas dos portugueses, até porque as ex-colónias sempre estiveram abandonadas à sua sorte, sem uma política de desenvolvimento e por conseguinte se não havia condições para os naturais, muito menos para receber colonos ou emigrantes...
É neste quadro negro que as minas no Pejão laboravam a todo o gás possível, com o fim de tirar das suas entranhas o carvão imprescindível às necessidades, porque a tecnologia em serviço no país , fora concebida para consumir este fóssil. Neste contexto, tinha tido início no pós-guerra, talvez, um dos melhores períodos da Companhia Carbonífera de capital belga. Havia ali muito trabalho, especialmente nas minas e como eram tarefas que exigiam pouca qualificação, o recrutamento era feito nas povoações do Couto Mineiro e nas suas redondezas; o pessoal mais especializado era recrutado noutros pontos do país e a quem era atribuído outras condições e melhores remunerações!
A provar este bom momento da Carbonífera, teve início no ano de 1949 um conjunto de actividades nas áreas da Cultura e do Desporto e que iam desde a música, alguma representação na área do teatro, projecção de cinema em alguns pontos do Couto Mineiro e ainda no futebol, atletismo, ciclismo, ténis e uns anos mais tarde na natação... Foi uma actividade cultural e desportiva sem precedentes naquela zona do Douro, e, será justo lembrar, que, na música, no atletismo e na natação, uma boa percentagem eram mesmo mineiros, ou que de alguma forma executavam tarefas ligadas à produção.
É neste contexto preciso, que os quatro chefes de família atrás referidos no início da história, fazendo parte dos activos da Carbonífera, se encontram regularmente executando tarefas de chefia intermédia de alguma responsabilidade, o que vai permitir que entre eles se estabeleça uma relação de amizade e sobretudo confiança, factor importante naquela época... Convém aqui referir que os portugueses duma maneira geral, cultivavam uma dose elevada de astúcia ou manha, como que a tentar compensar as falhas académicas, que eram naturais e também normais, uma vez que ninguém evolui sem as necessárias condições. Resumindo, eram as vítimas mas não eram os culpados!
Moram os quatro na mesma aldeia e a cerca de três quilómetros de Germunde, ponto fulcral e estratégico da Carbonífera, ali numa colina sobranceira ao Douro e por onde se escoava, através de barcaças construídas para esse fim, todo o carvão retirado das minas do Fôjo e Germunde e que seguiria desta última localidade para os mais variados destinos do território Nacional.
Por estas alturas, nos anos CINQUENTA, o tráfego diário no Douro era intenso... Por um lado era toda a azáfama dos RABELO, no vai-vem entre o vinhateiro Alto Douro e o Porto e Gaia e por outro era o vai-vem constante das Barcaças do Pejão entre Germunde e a Cidade Invicta!
É evidente que três dos quatro casais regulavam pelas mesmas idades e com os filhos sucedia o mesmo e por isso frequentavam a Primária na mesma Escola em Pedorido, que não tinha boas condições e seria um espanto se as tivesse... Se tudo viesse a desenhar-se dentro do que era habitual, dali a uns anos os rapazes iriam engrossar as fileiras da Carbonífera, enquanto as raparigas seguiriam o rumo das suas mães e tornar-se-iam boas donas de casa, assim se esperava, porque nada apontava para que viesse por aí alguma mudança, infelizmente.
Os anos vão passando, os cenários mantêm-se e atingimos o ano de 1953...
Mantinha-se a amizade entre os casais e de vez em quando o almoço domingueiro lá se concretizava, sempre em locais diferentes e um deles chegou a ter lugar em GAÍDO, um pequeno lugarejo do interior e pertencente à mesma freguesia!...

Até que naquele ano de 1953, talvez para fugir à rotina, vai-se lá saber porquê, os nossos personagens resolveram, desta vez, atravessar o Douro de barco para a outra margem, e já em Rio Mau iniciar a pé uma subida enorme e difícil, até atingir o ponto mais elevado da Serra da Boneca, e bem lá no alto, saborear aquele apetecível almoço domingueiro, mas, desta vez, tendo pela frente não só um cenário, mas vários, era só escolher, dependeria do gosto dos que haviam cortado a "meta" e foram todos da comitiva!`
A esta distância, tenho algumas ideias do que presenciei e que ficou em mim gravado:- «Desde logo atingimos com o olhar áreas enormes, muito casario distribuido duma forma desordenada, dentro dum enorme espaço verde e que contrasta naturalmente; uma cadeia de montes em zigue-zague, em que uns sobressaem e dão nas vistas, também pela proximidade como é o caso do monte de S. Domingos, e por último destacava-se lá no fundo o Douro e as suas águas pouco límpidas, mais os seus inseparáveis areais e que fazem um contraste natural com toda a mancha verde do arvoredo diversificado e que o envolve, quase esconde o RIO, ou será que quer sòmente protegê-lo?... Na verdade, não são só os montes que fazem os tais zigue-zagues ou que serpenteiam; o Douro faz precisamente o mesmo e serpenteia desde as longínquas terras de Espanha em caminhada veloz a caminho do litoral e da terra lusitana, aspirando chegar ao mar ATLÂNTICO, afim de completar a principal tarefa de que foi incumbido há milhões de anos e que é de completar todo o seu ciclo. Teremos todos de concordar que o Douro merece de nós, humanos, admiração e respeito, porque sempre fez bem a sua principal missão, a de completar o seu ciclo no Atlântico! Será por tudo isto que há quem afirme que OS RIOS SÃO ETERNOS?!.
Talvez, porque se tratasse duma caminhada mais longa e sobretudo mais difícil que as anteriores, os mentores resolveram desta vez, alargar o convite a mais pessoas e assim seriam TRINTA ou um pouco mais! Uma boa parte eram crianças, e, por via disso, resolveram "atacar" a Boneca da seguinte forma:- Dividiam-se em dois grupos; o grupo das crianças e das mulheres subiria por uma zona que achavam ser mais directa e mais fácil, sempre acompanhados por pessoa amiga de Rio Mau, chamado ORLANDO SOUSA, ainda vivo felizmente e que conhecia não só toda a subida, mas também o ponto de encontro com o segundo grupo; eu próprio, contador da história e que só tinha dez anos, naturalmente, fiz parte do primeiro grupo; o segundo grupo, composto por homens, levava também um guia e que era seguramente de Rio Mau, mas que já não consigo recordar... Este segundo grupo pretendia "atacar" a Serra pela vertente mais difícil, que era seguir parte do percurso mais importante do ribeiro e que dá pelo nome de rio Mau, donde a povoação vai "beber" o nome e acompanhá-lo para montante desde a Levada, passando pelo Poço Negro,pela Estivada, onde pontificavam os moinhos movidos pelas águas deste pequeno afluente do DOURO e que com o seu trabalho intenso, deveriam produzir toda a farinha e o PÃO necessário às três localidades da margem direita: Rio Mau, Sebolido e até Melres! Este segundo grupo, a determinada altura do percurso deixaria de acompanhar o curso do ribeiro e tomaria uma outra rota, com o objectivo de se encontrar com o nosso grupo; o essencial terá corrido dentro do previsto e os grupos lá se encontraram, ali às portas duma pequena localidade chamada CABROELO e a partir dali encetamos uma travessia de sentido ascendente, procurando chegar ao ponto mais elevado da BONECA, onde existe um marco como referência. Não foi nada fácil, esta parte final até à "meta", lá no alto, não só porque todos estariam já bastante cansados, mas porque não existia um caminho, ou mesmo um carreirito, desajeitado que fosse e que suavizaria as dificuldades até ao cume. Resultou, por isso que as crianças sentiram e de que maneira as dificuldades do terreno e houve que recorrer a recursos como gatinhar, trepar obstáculos, contornar por fora algumas elevações de ardósia solta e que criaram muito embaraço...
Finalmente, todos atingiram o cume da Serra e ninguém se magoou a sério da aventura que os adultos a todos arranjaram, com mais razão de queixa para as crianças... Seguiu-se de imediato a escolha do local para estender as toalhas, mesmo que fosse preciso improvisar, colocar os pratos, os talheres e os copos da bebida, sempre fundamental nestas circunstâncias e sem cerimónia e num ambiente de muita alegria, dar início ao melhor almoço, que todos os presentes até àquele domingo haviam saboreado: ALMOÇAR NO PONTO MAIS ALTO DA BONECA!
Tenho uma vaga ideia, porque muitas coisas se perdem da nossa MEMÓRIA, mas neste preciso momento do almoço, nenhum trocou as lindas paisagens pela comida!... Tudo isso ficou para depois, quando a disposição melhorou e houve até direito à fotografia colectiva, lá bem no alto da Serra e que ficará a atestar que não foi um sonho de um qualquer, mas um acontecimento real e que não voltaram a repetir, vai-se lá saber porquê?!...
Passaram já CINQUENTA e SEIS ANOS sobre aquela data! Quem haveria de dizer!...
Os quatro chefes de família que estiveram na origem destes acontecimentos foram desaparecendo e só nos resta a lembrança e muita saudade, e, tudo isso, irá também um dia morrer connosco, inexoravelmente...
Do restante colectivo, só um ou outro terá desaparecido, felizmente a maior parte está aí para recordar, se for o caso e quem sabe, poder ainda voltar à Serra da Boneca e dali usufruir ainda com mais liberdade, com a LIBERDADE que ABRIL veio possibilitar e dar a conhecer, que os HOMENS poderão ser ainda mais IGUAIS nas DIFERENÇAS, que são óbvias e salutares!

Pensemos todos nisso!

UM ABRAÇO DO TAMANHO DA BONECA PARA RIO MAU E PEDORIDO!